Philippe Garrel, de 75 anos, conceituado cineasta de culto do movimento Nova Vaga, foi acusado de assédio sexual por cinco atrizes.
Pelas personalidades envolvidas, o assunto está a ter forte impacto na imprensa e indústria francesas após ser revelado na quarta-feira pelo jornal 'online' independente Mediapart [acesso pago], que tem estado na vanguarda da investigação de vários casos #MeToo, como os dos cineastas Luc Besson e Christophe Ruggia, e do ator Gérard Depardieu.
As acusações envolvem a oferta de papéis em filmes em troca de favores sexuais e quatro atrizes ainda relataram tentativas de beijo contra a sua vontade.
Com uma carreira iniciada na década de 1960 e vários prémios nos festivais mais importantes do mundo, incluindo o Urso de Prata para Melhor Realização este ano no Festival de Berlim pelo drama "Le Grand Chariot", protagonizado pelos filhos Louis Garrel e Esther Garrel (ainda inédito em Portugal), Philippe Garrel negou ao jornal quaisquer agressões, mas pediu desculpa por ter "magoado" algumas das atrizes no que descreveu como casos de "sentimentos mal interpretados" ou uma "tentativa de sedução incoerente ou desastrada".
O realizador acrescentou nunca ter beijado uma mulher sem o seu consentimento ou dado falsas expectativas profissionais a uma atriz com o objetivo de a seduzir.
Anna Mouglalis trabalhou com Philippe Garrel em "Ciúme", de 2013, e disse ao jornal que ele o convidou a ir à sua casa por falar de um novo projeto e o encontrou deitado na sua cama.
A atriz, 30 anos mais nova, diz que lhe chamou imediatamente um táxi, mas descreveu o seu comportamento como "insultuoso" e "uma caricatura de misoginia e machismo básicos".
O realizador negou o sucedido ao Mediapart, dizendo que se sentiu mal e pediu para se deitar na cama durante algum tempo.
Um segundo relato envolve Clotilde Hesme, que entrou aos 24 anos em "Os Amantes Regulares", filme vencedor do Leão de Prata do Festival de Veneza em 2005, ao lado de Louis Garrel, e foi ainda uma das alunas do cineasta no Conservatório de Artes de Paris.
Descrevendo ainda estar “pasmada” com o comportamento, a atriz alega que ele a “humilhou” durante a rodagem, apelidando-a de “incesto”, já que "a história de amor era entre o filho dele e eu no filme”.
Ao Mediapart, o realizador desmentiu: “Para ser sincero, não percebo realmente essa afirmação”.
Os outros depoimentos envolvem tentativas de beijos sem consentimento, como o que aconteceu com Laurence Cordier quando estava no último ano do Conservatório de Paris em 2003 e o cineasta a convidou para falarem de um papel: no final, caminharam juntos e ele aproximou-se mais e propôs um quarto de hotel para estarem juntos. A atriz alega ainda que teve de o afastar após ter sido agarrada pela cintura.
Philippe Garrel respondeu que "não se lembra de nada específico", mas acrescentou "lamento muito se Laurence Cordier se sentiu humilhada".
No único depoimento anónimo, uma atriz que teve um pequeno papel em "O Amante de um Dia" (2017) diz ter sido chamada no ano a seguir para falarem de um novo projeto num quarto de hotel, o que recusou. O encontro realizou-se num café e o cineasta terá passado a mão pela perna da atriz e, ao deixá-la no metro, ainda a tentou beijar.
Em resposta, o realizador fala apenas que existiu "um beijo na bochecha".
O único depoimento que não é desmentido por Philippe Garrel é o de Marie Vialle sobre os vários encontros profissionais quando era sua estudante no Conservatório: em 1994, o realizador disse-lhe que tinha escrito um papel a pensar nela para um filme, que estava apaixonado por ela e tentou beijá-la.
"Não consigo fazer o filme se não dormir contigo", recordou a atriz ao Mediapart de ter ouvido da boca do cineasta antes de recusar as investidas e o projeto.
Os dois acabariam por colaborar em "Le Vent de la Nuit", de 1999, protagonizado por Catherine Deneuve e considerado um dos melhores filmes da fase artística mais recente do cineasta.
Ao jornal, Philippe Garrel garante que os seus sentimentos eram sinceros: "Lembro-me de lhe ter explicado que, como muitos realizadores da Nova Vaga, gostava de filmar com a mulher por quem estava apaixonado. Posso ter tentado beijá-la, não me lembro, mas ela certamente que me rejeitou pois foi justamente nesse almoço que percebi que não estava nada atraída por mim”.
"Se magoei a Marie Vialle, por quem tenho muito respeito, lamento muito”, acrescentou.
Até ao momento, não foram apresentadas queixas nos tribunais franceses.
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