
Na quarta-feira, "Adolescência" esteve no centro de uma polémica quando uma das principais responsáveis do canal britânico Channel 4 disse que a Netflix se porta como "turistas da TV", aproveitando-se de um sistema que não ajudou a desenvolver.
Favorita aos prémios Emmy, a minissérie britânica foi lançada a 13 de março na plataforma e segue as consequências de um esfaqueamento fatal de uma estudante, revelando as influências perigosas a que os rapazes são submetidos 'online': aborda o perigo da propagação entre os jovens de ideias misóginas e discriminatórias, nas redes sociais e em grupos fechados na Internet.
Inspirada em casos semelhantes que aconteceram no Reino Unido, foca-se, sobretudo, na comunidade 'incel' (celibatários involuntários), maioritariamente composta por homens heterossexuais que se dizem incapazes de encontrar um parceiro romântico ou sexual.
Além de se tornar a segunda série em inglês mais vista de sempre na Netflix, apenas atrás da primeira temporada de "Wednesday", "Adolescência" gerou um intenso debate internacional, com a publicação de diversos artigos sobre a proliferação de conteúdos misóginos nas redes sociais, a proteção das crianças no ambiente digital e o sentimento de impotência dos pais.

Executivos britânicos descreveram o projeto como muito caro para os parâmetros da indústria local e só possível com o financiamento obtido numa co-produção: entre os parceiros está a norte-americana Plan B, produtora que tem Brad Pitt entre os fundadores.
Mas não faltam pais disponíveis para um sucesso e Louisa Compton, que dirige as secções de notícias, atualidade e desporto no Channel 4, descreveu o seu canal como "pais orgulhosos" de "Adolescência".
A razão? Ao longo de vários anos e projetos como "This is England '86" e "Help", foi o Channel 4 que deu as primeiras oportunidades aos criadores Jack Thorne e Stephen Graham.
“Desenvolvemos e cultivamos o talento que permitiu à Netflix entrar como 'turistas da TV' e efetivamente encomendar ["Adolescência"]. Sem nós, não teria acontecido. Nós cultivamos onde as plataformas de streaming não cultivam”, explicou durante o debate de abertura do Festival de Televisão de Edimburgo, segunda a notícia do Deadline.
Rapidamente alastrou a expressão "turistas da TV" e mais tarde, no mesmo festival, o chefe de conteúdos do Channel 4 colocou alguma "água na fervura".
"Adoramos a Netflix" enquanto plataforma, disse Ian Katz, que esclareceu o que a sua colega "queria dizer é que há um pequeno problema quando as plataformas de streaming globais ficam felizes por tirar proveito de um ecossistema global incrivelmente rico que foi construído ao longo de anos e anos por canais públicos que investiram em talentos, em pequenas produtoras, espalhados pelo país".
As declarações não foram suficientes para a responsável britânica da Netflix para as séries disfarçar o desagrado com a expressão "turistas da TV".
"A minha reação inicial foi de consternação. Acho que não sou uma turista — ando nisto há muito tempo", disse Mona Qureshi, citada pelo Deadline, quando lhe pediram uma reação num evento separado, uma 'masterclass' precisamente sobre "Adolescência".
E acrescentou a antiga executiva da BBC: "Nada sobre onde estou, onde nos encontramos e os debates que tivemos sobre 'Adolescência' surge de algo além de nós, dentro da equipa britânica, dedicarmo-nos exclusivamente a encontrar programas e falar para o nosso público local. Todos fazemos parte do mesmo ecossistema".
E concluiu: "'Adolescência' surgiu de algo que é simplesmente lermos um argumento e reagirmos a esta fantástica equipa criativa, totalmente empenhados em corresponder desde o início... ninguém está a pensar globalmente, 'vamos fazer algo global'. Trata-se apenas de estar em sintonia com o que o mercado local deseja e com o que nós, como responsáveis, sentimos que nos inspira e impulsiona”.
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