
Gérard Depardieu foi considerado culpado de agressões sexuais a duas mulheres durante a rodagem de um filme em 2021, no primeiro grande processo em França com ecos do movimento #MeToo.
O tribunal correcional de Paris anunciou o veredito pouco depois das 10h00 locais, que terá impacto no primeiro dia do Festival de Cinema de Cannes.
O ator de 76 anos foi condenado a uma pena de 18 meses de pena suspensa, correspondendo ao pedido do Ministério Público em março.
A sentença pelo juiz Thierry Donard também impôs uma pena de inelegibilidade para cargos públicos durante dois anos e a inscrição no registo de criminosos sexuais, seguindo os outros pedidos dos procuradores.
Para tomar a decisão, “o tribunal teve em conta a idade do arguido, a deterioração do seu estado de saúde e a sua posição sobre os factos, que contesta, uma vez que não parece ter compreendido o conceito de consentimento”, explicou o magistrado.
O tribunal concluiu que uma das mulheres, uma cenógrafa de 54 anos chamada Amélie K., prestou um depoimento consistente, assim como as testemunhas diretas e indiretas, enquanto o do ator foi mudando ao longo do tempo. Também foi condenado por agredir Sarah (nome fictício), de 34, uma assistente de realização no mesmo filme.
O ator também terá de pagar uma indemnização de mil euros a Amélia e Sarah por "vitimização secundária", uma inovação jurídica recente que cobre o sofrimento adicional das mulheres devido ao próprio julgamento.
Depardieu sempre defendeu a sua inocência. Foi o seu advogado Jérémie Assous que esteve presente e anunciou que vai apelar da sentença: o intérprete de mais de 200 filmes e séries está a trabalhar na ilha de São Miguel, nos Açores, com a sua amiga Fanny Ardant, uma atriz conhecida da sua geração que depôs a seu favor durante o julgamento.
O advogado criticou fortemente a decisão do tribunal, argumentando que “a partir do momento em que se é implicado num caso de agressão sexual atualmente é-se automaticamente condenado”.
“Estou muito satisfeita com esta decisão, é uma vitória para mim. Foi feita justiça”, afirmou Amélie à imprensa presente no tribunal, referindo estar “muito emocionada” com a decisão.
Já a sua advogada, Carine Durrieu-Diebolt, defendeu que já não se pode “continuar a dizer [que Gérard Depardieu] não é um abusador sexual”, relembrando as restantes vítimas.
“Espero que este seja o fim da impunidade para um artista da indústria cinematográfica”, acrescentou.
Os incidentes relatados remontam à rodagem do filme "Les Volets Verts", de Jean Becker, em 2021.
Em 2024, Amélie apresentou uma queixa alegando agressão sexual, assédio sexual e insultos sexistas.
Após a abertura da investigação, outra mulher, a assistente de realização, também o acusou de abuso sexual durante a mesma rodagem.
No julgamento intenso e amplamente divulgado, o ator reconheceu que era uma pessoa “vulgar, rude e desbocada”, mas que não cometeu qualquer agressão sexual.
Depardieu foi acusado de comportamentos inadequados por cerca de vinte mulheres, mas este foi o primeiro caso a chegar a tribunal.
A atriz francesa Charlotte Arnould foi a primeira a registar uma queixa. Em agosto, o Ministério Público de Paris solicitou que o ator fosse julgado por violações e agressões sexuais.
Amélie K.
Segundo a cenógrada, Depardieu assediou-a a 10 de setembro de 2021, imobilizando-a entre as suas coxas, tocando-lhe o púbis e subindo até aos seus seios.
Na queixa, denunciou que, durante a rodagem numa mansão privada no 16.º bairro de Pariss, o ator gritou que queria um "ventilador" porque não conseguir sequer "ter uma ereção" devido ao calor.
Em seguida, afirmou que podia "fazer com que as mulheres chegassem ao orgasmo sem tocá-las" e, uma hora depois, agarrou-a "com brutalidade" e apalpou a sua cintura, ventre e seios, ao mesmo tempo que proferia "comentários obscenos", segundo o seu relato.
"Sarah"
Sarah afirmava que, a 1 de setembro de 2021, o ator colocou "a mão nas [suas] nádegas", entre outras agressões.
"Nessa noite a sua equipa não estava lá. Saímos do camarim, estava escuro e, no fim do caminho, ele tranquilamente colocou a mão nas minhas nádegas", descreveu aos juízes durante o julgamento.
A mulher explicou que o ator a agrediu duas vezes, tocando as suas nádegas e seios. Nas duas vezes, "eu disse não!", exclamou.
Num primeiro momento, a assistente de realização não disse nada sobre o ocorrido até desabafar com o seu superior, que exigiu da produção um pedido de desculpas do ator.
Ele desculpou-se "muito contrariado", lembrou Sarah. Então, transformou a sua vida num inferno, chamou-a de "bufa" e "maluca" além de se recusar a trabalhar com ela, disse.
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