Várias personalidades e entidades, da Cultura à Política, recorreram às redes sociais para homenagearem o realizador António-Pedro Vasconcelos, que morreu hoje aos 84 anos, recordando-o pelo cinema mas também como um homem de causas.
O primeiro a recordar António-Pedro Vasconcelos, e a tornar pública a notícia da sua morte, foi o antigo ministro da Cultura João Soares.
“Admirava-o muito como cineasta, a obra que nos deixa é notável. Também como cidadão, cujas opiniões respeitava e muitas vezes seguia”, partilhou João Soares, lembrando que António-Pedro Vasconcelos “teve um papel muito importante na campanha presidencial” do seu pai, Mário Soares, nas legislativas de 1986.
O realizador, que “foi amigo e apoiante sem falhas de Mario Soares, sempre”, é autor da letra do hino da campanha eleitoral de 1986 de Mário Soares, “Rock da Liberdade”, cantado por Rui Veloso.
O escritor João Tordo lembrou outra faceta de “um dos realizadores mais queridos do público português”, a de “um enorme leitor”.
“Falei sempre muito mais de livros com ele do que de cinema; conhecia tudo, queria conhecer ainda mais e não se cansava de falar e escrever sobre as novas gerações de romancistas. Um apaixonado pela narrativa, APV [como era tratado pelos amigos] vai deixar saudades pelos seus filmes, a sua permanente curiosidade e a sua maneira de ser generoso”, escreveu.
O realizador António Ferreira lembrou que o “camarada e amigo” António-Pedro Vasconcelos o ajudou “muito” nos primeiros anos da carreira, sem o conhecer de lado nenhum, “simplesmente porque gostava” dos seus filmes.
Também António Ferreira fala no “homem incansável e lutador das causas públicas, nomeadamente em defesa da RTP e da TAP, que sempre estiveram sob ataque, e por um sistema justo de apoios ao cinema que era a sua grande paixão”.
A atriz e presidente da Câmara Municipal de Almada, Inês de Medeiros, partilhou que, “curiosamente”, não foi no cinema que trabalhou com APV e aprendeu a admirá-lo. “Foi nas grandes causas que partilhámos: contra a privatização da RTP, contra a privatização da TAP e ainda na firme oposição à exploração de petróleo no Algarve”, escreveu sobre o homem “das sete artes e não apenas da Sétima Arte”.
O argumentista Tiago R.Santos conta que nas últimas conversas com APV, este “falava muito do futuro”: “Estava pessimista, acreditava que a Humanidade se aproximava do fim de um ciclo, temendo pelo que aí vinha - mas nada que o impedisse de continuar a lutar de forma incansável, como passou a vida a fazer, pelas coisas em que acreditava”.
“Não sei que vida profissional teria sem o A-PV, mas não seria esta, pela qual estou tão grato. Devo-lhe muito, não só pelos cinco filmes em que colaborámos mas também pela confiança, amizade e por tudo que me ensinou sobre cinema, literatura e tantas outras coisas que o entusiasmavam. Falarei dele sempre que alguém me perguntar como é que aqui cheguei”, escreveu.
Os atores José Mata, João Jesus e Fernanda Serrano, que foram dirigidos por APV, lembraram o “nome incontornável” da Cultura e do Cinema, que “respirava cinema e amor” e a quem agradecem por “tudo o que fez e deu ao cinema português, aqui e lá fora, à cultura, ao futebol, à arte, à política, à vida de todos”.
O ator Ruy de Carvalho despediu-se do “estimado amigo”, referindo que sem ele “o cinema fica muito mais pobre”.
Os fundadores do Fantasporto, Mário Dorminsky e Beatriz Pacheco Pereira, recordam que o realizador foi homenageado com o Prémio Carreira e uma retrospetiva da sua obra naquele festival. “Obra, carreira marcada primeiro pela criação, assim se pode dizer do Cinema Novo Português, responsável por alguns dos maiores êxitos do cinema português alguns deles que garantiram números de espectadores excepcionais para Portugal, ultrapassando os resultados dos filmes norte-americanos que dominavam o circuito comercial nacional”, escreveram.
A escritora Inês Pedrosa lembrou o “excelente cineasta” e “homem generoso, sempre disponível para ajudar e incentivar os jovens que chegavam ao cinema”.
As políticas Ana Gomes e Catarina Martins, bem como o comentador Daniel Oliveira salientaram a intervenção cívica de António-Pedro Vasconcelos.
“Os filmes, sempre os filmes, as conversas, os debates acessos sobre política cultural, os livros, a luta contra as privatizações que assaltam o país. O tanto que te devemos. Obrigada”, escreveu Catarina Martins.
Ana Gomes lembrou o cinema, a arte, a consciência cívica, “o infatigável combate pelo bem da comunidade”.
Daniel Oliveira partilhou que conheceu o realizador “durante os anos duros de 2011-2014, nos movimentos que criou contra a privatização da TAP e dos CTT”, salientando que este “foi incansável no ativismo cívico”.
Também a Câmara Municipal de Lisboa, a empresa municipal de Cultura EGEAC, a junta de freguesia da Estrela, onde APV vivia, recordaram “a incontornável da cultura portuguesa, com uma forte intervenção cívica e um defensor de causas”.
Em comunicado enviado às redações, a Guerra e Paz Editores despediu-se “com pesar” do realizador “de alguns dos maiores sucessos de bilheteira do cinema português”.
Para aquela editora, recordar APV é, “inevitavelmente, recordar a publicação de ‘António-Pedro Vasconcelos: Um Cineasta Condenado a Ser Livre’, livro que resultou de uma entrevista de vida dada pelo homenageado a José Jorge Letria”, e no qual o realizador “mostrou a sua admiração por Rossellini, a sua paixão pela literatura, de Sade a Marx, de Hemingway a Chandler, e as suas convicções do que devia ser a política cultural do nosso país, confessando que se sentia condenado a ser livre”.
A Sociedade Portuguesa de Autores (SPA) lamentou a morte do cineasta, beneficiário daquela instituição desde 1975 e seu cooperador desde 1986 , destacando “a riqueza e diversidade da sua vida e obra” e lembrando que APV foi galardoado com a medalha de honra da cooperativa em 2008 e recebeu o Prémio Consagração de Carreira em 2013.
A Gedipe - Associação Para a Gestão de Direitos de Autor, Produtores e Editores Cinematográficos e Audiovisuais, a Federação Editores de Videogramas (FEVIP) e a Associação Portuguesa de Empresas Cinematográficas (APEC) lamentaram igualmente a morte do realizador, que, em comunicado conjunto, consideram "um dos maiores expoentes da arte cinematográfica e audiovisual, multifacetado na sua longa carreira coroada de êxitos".
A Associação de Realizadores de Cinema e Audiovisual (ARCA), por seu lado, recorda "quem fez o cinema de que gostamos e lutou por melhores e mais justas condições para os cineastas".
"Ao longo do tempo futuro tudo faremos para honrar a memória e o trabalho de quem tanto contribuiu para que fossemos melhores e lutou incansavelmente por um País, no mínimo, ao nível da comunidade das nações mais desenvolvidas", escreveu a ARCA.
Também a Associação de Produtores de Cinema e Audiovisual (APCA) divulgou um comunicado a propósito da morte de António-Pedro Vasconcelos, “um dos mais importantes realizadores da geração do Cinema Novo português nos anos 60, onde se destacou como um dos fundadores do Centro Português de Cinema, cooperativa que através do apoio da Fundação Calouste Gulbenkian inovou os modos de produção e os temas abordados, rompendo com o cinema institucional do SNI que servia a ditadura fascista do Estado Novo”.
A associação lembra que, após o 25 de Abril de 1974, o realizador “teve uma atitude clara e empenhada na transformação social do país, perante a aproximação da União Europeia elaborou um 'think tank' sobre o futuro do cinema nacional, e como Presidente da associação de realizadores ARCA tomou parte ativa em diversos movimentos associativos visando o desenvolvimento do cinema e do audiovisual nacional”.
“Todos lhes estamos reconhecidos pelo seu empenho na causa pública, em particular na defesa da televisão pública RTP e da TAP, como em tantos outros momentos políticos que tomou com convicção a defesa dos seus ideais. Para o Cinema Português foi um homem incansável, sempre empenhado na luta por melhores condições de produção e pela existência de um sistema mais justo e transparente de atribuição de apoios aos filmes nacionais”, lê-se no comunicado.
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