
A cantora, dançarina e atriz Nicole Croisille morreu na noite de terça-feira, aos 88 anos, deixando a sua marca na memória popular com sucessos, mas especialmente com a inebriante "chabadabada" de "Un homme et une femme" ("Um Homem e uma Mulher").
O filme de 1966 dirigido por Claude Lelouch que juntou Anouk Aimée e Jean-Louis Trintignant ganhou a Palma de Ouro do Festival de Cannes e dois Óscares, marcando gerações de espectadores.
Também foi atriz à frente das câmaras como atriz e embora as presenças te nham sido mais escassas e menos relevantes, a despedida foi com o papel de Madame Reichert em "A Gaiola Dourada" (2013), de Ruben Alves, um grande sucesso nos cinemas portugueses.
Eleita a "voz mais bonita de 1975", Nicole Croisille personificou as chamadas "cantoras vocais", num estilo que ia na contramão da música yé-yé, mas que se tornaria moda duas décadas depois com as suas irmãs mais novas, Patricia Kaas e Lara Fabian.
"Só cantei canções de amor e sei o que levei às pessoas", confidenciou esta celibatária convicta, sem marido nem filhos, à revista Paris Match em 2017.
Os seus sucessos, como "Parlez-moi de lui" (1973), "Une femme avec toi" (1975) e "Téléphone-moi" (1975), marcaram a década de 1970.
No total, lançou cerca de vinte álbuns de estúdio.
O seu encontro com o cineasta Claude Lelouch e o compositor Francis Lai em 1966 foi decisivo. A banda sonora de "Um Homem e uma Mulher", interpretada por si e Pierre Barouh, tornou-se um clássico de culto pela sua onomatopeia cativante e envolvente, que se tonrou com o tempo no "chabada-bada".
Esta música consagraria Nicole Croisille na carreira do realizador, que a voltaria a chamar para as bandas sonoras de "Viver para Viver" (1967), "Uns e os Outros" (1981), "Itinerário de uma Vida" (1987) e "Il y a des jours... et des lunes" (1990).
"A sua voz, tão singular, era o sopro dos meus filmes, a música das minhas emoções. Juntos, criámos momentos de eternidade. O seu timbre único deu vida às imagens, transformando cada sequência num momento de graça", elogiou Claude Lelouch, de 87 anos, no Instagram.
Paixão pelo jazz

Nascida a 9 de outubro de 1936 em Neuilly-sur-Seine, Nicole Croisille começou a sua carreira artística como dançarina, primeiro com o balé da Comédie-Française, onde ingressou aos 17 anos. Três anos depois, em 1957, conseguiu o papel principal em "L'Apprenti fakir", um espetáculo musical de Jean Marais.
Artista completa, aprendeu a representar na Comédie-Française com Jean Hervé, a fazer mímica com Marcel Marceau, a cantar na Ópera e a dançar numa turma onde a sua mãe tocava piano, antes de se tornar figurinista no Barraults e no Folies Bergères.
No início, foi o jazz que transportou a jovem Nicole Croisille: em 1958, juntou-se ao grupo de Joséphine Baker, que contribuiu para o surgimento desse movimento musical em Paris, e depois conheceu-o diretamente nos EUA durante uma digressão com Marcel Marceau.
O seu primeiro single, "Dieu Merci, Il M'aime Aussi", em 1961, foi uma adaptação de "Hallelujah i love her so", de Ray Charles.
Com "Le Blues du businessman" — um sucesso da Starmania que adaptou para "Itinerário de uma Vida" — ela alcançou o seu último grande sucesso popular em 1985, antes de regressar às suas primeiras paixões com faixas de jazz e bossa nova ("Jazzille", 1987, "Black et Blanche", 1991, "Bossa d'hiver", 2008).
Perto do fim da sua carreira, esta mulher trabalhadora e apaixonada por reviravoltas regressou aos palcos, desta vez como atriz nos teatros parisienses.
Em 1992, realizou o seu "sonho" ao interpretar a protagonista de "Hello, Dolly!", uma comédia musical americana.
Após interpretar uma "velhinha malandra" — nas suas próprias palavras — em "Hard", uma peça destravada sobre a indústria pornográfica, interpretou em 2019 nos palcos a ex-amante de um rico antiquário na comédia de humor negro "N'écoutez pas, mesdames!", de Sacha Guitry, ao lado de Michel Sardou.
"Estou a divertir-meo muito! Na minha idade, só gosto de desafios!", dizia à France-Presse pouco antes de completar 83 anos.
Comentários