Uma das opositoras mais influentes ao movimento pelos direitos transgénero, vendo-o como um ataque aos direitos das mulheres, J.K. Rowling não tenciona perdoar às estrelas de "Harry Potter" Daniel Radcliffe e Emma Watson, que se distanciaram e criticaram publicamente as suas posições.

Pelo contrário, a escritora engloba-as nas 'celebridades que deviam guardar as suas desculpas para as pessoas traumatizadas que fizeram destransição (interrupção ou reversão de uma identificação transgénero) e as mulheres vulneráveis ​​que dependem de espaços unisexo'.

A posição surgiu após a publicação na quarta-feira de um estudo da prestigiada pediatra Hilary Cass que concluiu que adolescentes na Grã-Bretanha foram autorizados a mudar de sexo com base em 'indícios extraordinariamente fracos' e 'falta investigação de alta qualidade' sobre os efeitos da administração de bloqueadores da puberdade e hormonas às crianças.

Rowling não demorou a escrever na rede social X (antigo Twitter) que o relatório era um momento 'separador de águas' que 'expõe a tragédia' de permitir a transição de menores.

Nas reações, um utilizador escreveu que Radcliffe e Watson lhe deviam 'um pedido de desculpas muito público... seguros de que você lhes perdoaria', ao que Rowling respondeu 'Não é seguro, infelizmente'.

E acrescentou: 'Celebridades que aderiram a um movimento que pretende minar os direitos duramente conquistados pelas mulheres e que usaram as suas plataformas para celebrar a transição de menores podem guardar as suas desculpas para as pessoas traumatizadas que fizeram destransição (interrupção ou reversão de uma identificação transgénero) e as mulheres vulneráveis ​​que dependem de espaços unisexo".

A DECLARAÇÃO.

De escritora de sucesso mundial a feminista controversa envolvida em polémicas

Musa de algumas correntes feministas, mas acusada de transfobia, a autora da bem-sucedida saga "Harry Potter", J.K. Rowling, tornou-se uma personalidade controversa nos últimos anos após diversas polémicas nas redes sociais.

A escritora britânica defende-se das acusações, mas as controvérsias mancham para alguns a sua imagem como autora de origem humilde, cujas aventuras de aprendizes de feiticeiro alcançaram um sucesso planetário com mais de 600 milhões de livros vendidos.

O último episódio ocorreu neste mês, com a entrada em vigor de uma nova lei na Escócia sobre a luta contra o ódio, incluindo o ódio contra pessoas transgénero.

A autora de 58 anos, que vive em Edimburgo desde meados da década de 1990 com o seu segundo marido, publicou no dia 1 de abril uma série de mensagens na rede social X.

Nelas, J.K. Rowling listou várias mulheres transgénero, algumas condenadas por crimes sexuais, antes de concluir: "As pessoas mencionadas [...] não são mulheres de forma alguma, mas homens".

A escritora também considerou que a liberdade de expressão está ameaçada se "a descrição precisa do sexo biológico" de uma pessoa se tornar algo repreensível, o que gerou uma nova onda de acusações de transfobia.

As suas opiniões inserem-se num debate aberto e às vezes tenso no Reino Unido sobre identidades trans, alimentado também por veículos conservadores que têm retratado Rowling como uma "heroína", como foi recentemente afirmado num artigo de opinião do tablóide Daily Mail.

Tudo começou em 2018, quando a escritora gostou de um tweet que descrevia as mulheres transgénero como "homens de vestido". Criticada, Rowling reconheceu o erro.

Em 2019, ela defendeu publicamente uma investigadora, Maya Forstater, demitida por tweets considerados transfóbicos.

Já em 2020, J. K. Rowling ironizou sobre um artigo que usava a fórmula "pessoas com menstruação".

"Tenho certeza de que costumava haver uma palavra para essas pessoas. Alguém me ajuda. ¿Wumben? Wimpund? Woomud?", disse em referência à palavra em inglês "women" (mulheres).

Foi uma declaração que levou Daniel Radcliffe ou Emma Watson, que interpretam o famoso feiticeiro e sua amiga Hermione Granger, mas também outros atores de "Harry Potter" a distanciaram-se da escritora.

Em 2022, Rowling opôs-se a um projeto de lei escocês que tentava simplificar o reconhecimento da mudança de género e que foi bloqueado pelo governo britânico.

A escritora diz-se uma militante feminista, especialmente contra a violência sexual e conjugal da qual revelou ter sido vítima, mas considera que os direitos das mulheres podem ser comprometidos por algumas reivindicações dos defensores dos direitos trans.

Rowling diz-se especialmente preocupada com a autorização para que mulheres transgénero possam entrar em vestiários, banheiros ou prisões reservadas para mulheres.

Fenómeno social

Nascida a 31 de julho de 1965 em Chipping Sodbury, no oeste da Inglaterra, a pequena Joanne cresceu numa família modesta e desde muito cedo começou a escrever e contar histórias nascidas da sua imaginação.

Depois de estudar francês, Rowling torna-se tradutora na Amnistia Internacional em Londres. Numa viagem de comboio de Manchester a Londres, ela imagina a história de Harry Potter, um miúdo de 11 anos que descobre que tem poderes mágicos e vai estudar numa escola de feiticeiros.

Os sentimentos do seu herói órfão ressoam com os da morte prematura da sua própria mãe, quando a escritora tinha apenas 25 anos.

Rowling vai ensinar inglês em Portugal, onde se casa e tem uma filha. Ela escreve as aventuras de "Harry Potter" todas as manhãs, antes de ir para o trabalho, e continua depois de regressar ao Reino Unido em 1995 para se instalar na Escócia com a sua filha após o seu divórcio.

A escritora viveu de benefícios sociais e levou mais de um ano para encontrar uma editora, a Bloomsbury, que quisesse publicar o primeiro volume da saga. Ao longo dos anos, os seus livros tornaram-se um fenómeno, com mais de 600 milhões de exemplares vendidos e traduzidos para mais de 80 idiomas.

Os oito filmes baseados na sua obra geraram cerca de 9 mil milhões de dólares de receita de bilheteira, tornando Rowling numa mulher bilionária.