O veterano cineasta Roman Polanski começou a ser julgado na terça-feira (5) na França, acusado de difamar a atriz Charlotte Lewis, que apresnetou queixa por uma agressão sexual alegadamente ocorrida na década de 1980 e que declarou perante o tribunal que ele esteve prestes a "destruir" a sua vida.
O realizador franco-polaco, de 90 anos, não compareceu ao julgamento num tribunal correcional de Paris, onde estava presente a queixosa, de 56 anos e residente no Reino Unido.
Lewis afirmou que foi vítima de "uma campanha de difamação" após declarar em pleno festival de Cannes, em maio de 2010, que o realizador a "agrediu sexualmente" durante um casting na sua casa em Paris em 1983, quando ela tinha 16 anos.
"Esteve prestes a destruir minha vida", disse em tribunal, assegurando que a cobertura do seu caso pela imprensa lhe provocou "um colapso nervoso" e a obrigou a mudar o filho, então com 6 anos, de escola.
Sobre a alegada agressão, Lewis afirmou: "Não sabia que o que tinha acontecido comigo era uma violação. Sabia que algo estava errado, mas não conseguia definir um nome".
A atriz, que participou no filme "Piratas" (1986), de Polanski, não apresentou queixa mas prestou depoimento à polícia americana.
"Mentira abominável"
No tribunal, a atriz garantiu que ele foi "amável" com ela durante a rodagem. Porém, nove anos depois da denúncia pública, em dezembro de 2019, o realizador nascido em Paris em 1933 disse que as acusações eram uma "mentira abominável", numa entrevista à revista francesa Paris Match.
Segundo o meio, Polanski tirou uma cópia de um artigo de 1999 do extinto tabloide britânico News of The World, sobre uma entrevista de Lewis ao jornalista Stuart White.
O diário britânico atribuía à atriz estas declarações: "Queria ser sua amante (...) Provavelmente desejava isso mais que ele". Mas, em 2010, Charlotte Lewis denunciou que as suas declarações "não [eram] exatas".
"A entrevista que dei a Stuart White não foi a entrevista que apareceu no jornal", reiterou Lewis esta terça-feira, acrescentando que só descobriu o artigo anos depois.
O ex-jornalista, que prestou depoimento a pedido da defesa, garantiu que entrevistou a atriz duas vezes após pagar 30 mil libras [quase 189 mil à cotação atual, cerca de 221 mil euros] pelo exclusivo.
White apresentou-a como uma mulher que "conta mentiras", mas disse não se lembrar se pediu para aprovar o texto da entrevista, escrita do ponto de vista assumido de uma "prostituta de 14 anos", antes da publicação.
Ao longo da carreira, diversas mulheres acusaram o vencedor do Óscar e da Palma de Ouro do Festival de Cannes de agressão sexual e violação, algumas quando eram menores. Ele sempre negou as acusações por factos já prescritos, que nunca o impediram de trabalhar. Também desmentiu a difamação.
A Justiça americana considera Polanski foragido há mais de 40 anos, após ser condenado por manter relações sexuais ilegais com Samantha Gailey, que tinha 13 anos.
Na época, Lewis explicou que quis partilhar a sua experiência para minar a defesa do realizador que assegurava, segundo ela, que o caso de Samantha Gailey era algo isolado.
Para Sabine Prokhoris, autora do livro "Qui a peur de Roman Polanski?" (Quem teme a Roman Polanski), em apoio ao cineasta, este julgamento "é uma maneira de querer silenciá-lo" porque "não se pode defender" num "julgamento justo" de "factos prescritos".
"Grande coragem"
"Difamar, desacreditar e caluniar fazem parte do sistema Polanski e isto é o que Charlotte Lewis denuncia com grande coragem", declarou Benjamin Chouai, advogado da queixosa.
Suíça, Polónia e França, onde vive atualmente, negaram-se a extraditá-lo para os EUA.
O cineasta mantém um perfil discreto desde 2020, quando a atriz Adèle Haenel abandonou indignada a cerimónia dos prémios César, que lhe atribuiu a distinção de Melhor Realização por "J'accuse - O Oficial e o Espião".
Este incidente tornou-se um dos símbolos da luta contra as agressões sexuais no mundo do cinema, que tomou força nos últimos meses com as acusações de várias mulheres contra o ator Gérard Depardieu.
O julgamento por difamação também coincide com a polémica gerada pelas acusações da atriz Judith Godrèche contra os realizadores Benoît Jacquot e Jacques Doillon por violação quando era menor.
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