Alec Baldwin desatou a chorar após uma juíza anular esta sexta-feira à tarde o seu julgamento por homicídio involuntário.
Mary Marlowe Sommer, que presidia ao julgamento em Santa Fé, Novo México, aceitou uma moção dos advogados de defesa, que alegavam que as autoridades esconderam da defesa indícios relevantes sobre a origem das balas verdadeiras que mataram Halyna Hutchins, a diretora de fotografia do filme de baixo orçamento "Rust", em outubro de 2021.
A juíza disse que balas potencialmente ligadas à morte, que poderiam ter sido favoráveis ao caso de Baldwin, não foram partilhadas com os seus advogados pela polícia e pelos procuradores.
“A retenção intencional desta informação por parte do Estado foi intencional e deliberada. Se esta conduta não atinge o nível de má-fé, sem dúvida que se aproxima tanto que mostra sinais de parcialidade arrasadora”, disse Sommer, deixando claro que estava chocada com as falhas da acusação.
“O tribunal conclui que esta conduta é altamente prejudicial ao réu. [...] A anulação sem possibilidade de recurso [dismissed with prejudice] é concedida para garantir a integridade do sistema judicial e a eficiente aplicação da justiça"”, acrescentou, significando que o ator não pode voltar a ser julgado criminalmente pelas mesmas acusações e provas.
Baldwin tem pela frente tem vários processos civis apresentados tanto no novo México como na Califórnia: um deles do viúvo da diretora de fotografia, segundo anunciou o seu advogado, uma vez que o acordo de indemnização que fora alcançado entre as partes em outubro de 2022 não foi cumprido, em parte por causa de uma disputada entre a produtora de "Rust" e a seguradora.
“Isto foi um desastre para o sistema judicial do Novo México. Conseguiram a atribuição de muitos fundos públicos para avançar com este caso. E foi isto que aconteceu com isso. uma completa catástrofe", disse John Day, advogado e comentador jurídico local, citado pela revista Variety.
VEJA O VÍDEO DO MOMENTO DA ANULAÇÃO.
Ocultação de provas
O surpreendente desenlance ao terceiro dia surgiu após a defesa de Baldwin apresentar uma moção que acusava as autoridades de suprimirem provas, colocando o caso em dúvida e levando Erlinda Ocampo Johnson, a outra procuradora especial da acusação, a demitir-se.
Baldwin manuseava um revólver Colt calibre .45 durante um ensaio trágico a 21 de outubro de 2021 no Rancho Bonanza Creek, no Novo México, quando a arma disparou uma bala que matou Halyna Hutchins e feriu o realizador Joel Souza.
A armeira Hannah Gutierrez, que carregou a arma fatal, já cumpre 18 meses de prisão por homicídio involuntário. Após ser conhecida a anulação do caso de Baldwin, o seu advogado disse a uma jornalista da NBC que tencionava apresentar uma moção para a sua libertação imediata.
O ator enfrentava a mesma acusação e podia ser condenado à mesma pena. Os procuradores sustentavam que ele ignorou as regras básicas de segurança de armas e agiu de forma imprudente no set.
O famoso advogado de Baldwin, Alex Spiro, argumentou sempre que este não tinha a responsabilidade de verificar o conteúdo da arma e não sabia que ela continha munições reais.
Mas o caso da defesa também se baseou fortemente no descrédito da investigação policial e acusações frequentes nas últimas semanas às autoridades de terem escondido grandes quantidades de informações, como relatórios forenses, e-mails e vídeos de lapela dos polícias, até à véspera do julgamento.
Na quinta-feira, durante o interrogatório a uma testemunha, ficou a saber-se que um estojo com balas reais potencialmente ligadas ao tiroteio fora entregue à polícia, mas não divulgado à defesa, a 6 de março deste ano, após o fim do julgamento da armeira, mais de dois anos após a tragédia de “Rust”.
O “Bom Samaritano” foi posteriormente identificado por Spiro como Troy Teske, um ex-polícia e amigo da família de Gutierrez, que disse às autoridades que as balas correspondiam às que mataram Hutchins.
Esta sexta-feira, o advogado acusou a polícia de ter “enterrado” as provas ao não juntá-las ao caso “Rust”, privando a defesa da oportunidade de as ver.
“O que era um plano perfeito”, disse ao tribunal.
Os fundamentos para a anulação começaram a tomar forma quando o advogado interrogava a perita forense Marissa Poppell, que confirmou ter recebido o estojo e catalogara as balas, mas fora orientada a não registá-las no caso sob instruções superiores, sem enviá-las ao FBI, a polícia federal dos Estados Unidos, para análises.
A procuradora especial Kari Morrissey esforçou-se por reagir, dizendo ao tribunal que nunca tinha visto ou ouvido falar das balas antes desta semana.
Questionada por Morrissey, Poppell afirmou que as balas não correspondiam à munição real encontrada no set de "Rust", o que parecia colocar fim ao assunto até à apresentação de surpresa da moção na quinta-feira perto das 20h00.
Uma manhã decisiva
Na sexta-feira de manhã, a juíza Sommer conduziu a tensa audiência, que durou pouco mais de uma hora, e decidiu mandar o júri para casa às 10h15 e continuar a discussão da moção.
As balas em questão estavam agora em tribunal e foram examinadas por todas as partes. Três delas pareciam corresponder às verdadeiras que foram encontradas no set de “Rust”.
A juíza interrogou Poppell, vários polícias e Seth Kenney, fornecedor das armas de apoio utilizadas em "Rust". Foram ainda visionadas imagens das câmaras das fardas dos polícias da entrega das balas.
Quando se descobriu que Morrissey tinha estado presente em discussões nas quais foi decidido não juntar ao caso as balas entregues em março, a procuradora tomou a decisão invulgar de se chamar voluntariamente a si própria como testemunha, numa derradeira tentativa de salvar o julgamento.
No depoimento, disse que as balas alegadamente “enterradas” não correspondiam às verdadeiras do set de “Rust” e tinham sido armazenadas num estado diferente, o Arizona, até ao dia do trágico acidente.
No final, a juíza não ficou convencida e anulou o caso, gerando reações emocionais entre Baldwin e a sua família.
Ouvido pela France-Presse, Carl Tobias, professor de Direito da Universidade de Richmond, pensa que o caso está terminado do lado criminal.
"O Ministério Público pode tentar de alguma forma apresentar um recurso extraordinário. Mas não creio que algum tribunal de recurso vá concordar com a procuradora. Deviam ter entregue, não entregaram", explicou.
Nos dois primeiros dias de julgamento, a narrativa da defesa de Baldwin é que a polícia não investigara de forma abrangente o caso e concentrou-se apressadamente no ator.
Spiro já mencionara nos seus argumentos iniciais na quarta-feira que, durante a perícia, o FBI danificara irreparavelmente o revólver Colt calibre .45 cuja bala atingiu Hutchins.
Isto impediu, segundo o advogado, a possibilidade de comprovar a versão de Baldwin colocado em causa pelas autoridades: que a arma disparou sem que ele apertasse o gatilho.
Esta sexta-feira, falou então de "um plano perfeito", insinuando que a destruição da arma e a supressão de provas foram intencionais para prejudicar o seu cliente.
Baldwin, de fato escuro e óculos de armação grossa, observava a discussão com expressão tensa e braços cruzados, enquanto a sua esposa, Hilaria, e os seus irmãos, Stephen e Beth, faziam o mesmo na parte de trás do tribunal.
A investigação do caso nunca esclareceu como as balas reais, encontradas no carrinho de apoio, na caixa de balas e nos coldres pertencentes a Baldwin e a outro ator, entraram no set de rodagem, algo proibido pelos padrões da indústria.
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