Substituir de forma breve um ator doente ou acrescentar um plano de drone sem ter de voltar ao local são algumas das opções que a Inteligência Artificial (IA) permite nas produções de ficção em televisões e plataformas de streaming.
Marianne Carpentier, diretora de inovação e tecnologias no Newen Studios (Grupo TF1, em França), recorda o seu "primeiro encontro" com a IA.
"Foi durante a quarentena da COVID-19, utilizámos a IA para substituir o rosto de uma atriz doente em duas cenas para fechar um episódio", conta durante os debates sobre a IA aplicada no Mipcom, o grande encontro mundial do audiovisual em Cannes, no sudeste da França.
"Os dois atores concordaram [incluindo o que dava a réplica]. Foi realmente incrível, fizemos isso rapidamente. Foi barato e eficiente, a diferença não foi vista no ecrã", detalha.
Um exemplo assombroso foi apresentado por Emily Golden, responsável pelo crescimento em Marketing da Runway, uma empresa de IA que trabalha com os estúdios de Hollywood. Era um anúncio publicitário com primeiros planos muito realistas do pugilista Anthony Joshua. No entanto, ele não estava disponível porque "treinava para um combate", relata.
"O único papel de Anthony Joshua foi aprová-lo no final", destaca.
O resultado foi uma redução de "50% do tempo de produção e uma diminuição do orçamento", destaca.
A IA também permite acrescentar, como explica a especialista, uma tomada de drone ao final da montagem, sem a necessidade de voltar ao local da rodagem.
"Inclusive uma tomada rudimentar durante o reconhecimento prévio à rodagem pode servir como base", comenta Golden.
A IA intervém no trabalho invisível, antes ou depois das filmagens. Serve para "otimizar o planeamento e as cenas de filmagem, quando já enfrentamos enormes restrições de disponibilidade de atores, cenários, etc., com várias filmagens numa mesma região, o que implica muitas variáveis para que uma única pessoa as possa gerir", descreve Carpentier.
Direitos de autor e empregos
“Embora saibamos como produzir conteúdo na França, talvez não sejamos os melhores em marketing e financiamento, porque na França esse ainda é um assunto tabu”, continua.
A IA gera muito rapidamente argumentos “visuais, moodboards e apresentações”, explica.
O moodboard “é o conjunto de recursos visuais usados antes da filmagem para dar uma ideia do que a série se tornará”, disse à France-Presse (AFP) Marianne Guillon, diretora da estrutura de treino do festival francês Séries Mania.
O festival lançará o seu primeiro 'workshop' de argumento baseado em IA generativa de 25 a 27 de novembro por videoconferência.
“Os anglo-saxões, especialmente os americanos, estão à frente em IA. É muito importante que o setor europeu se atualize”, insiste Guillon, que não participou no painel do Mipcom.
“A IA pode escrever notas de produção e economizar tempo”, enfatiza. “Quanto ao argumento, a IA atua como um super assistente”, explica esta profissional, confiante no valor insubstituível da contribuição humana.
“Já existem filmes, bastante curtos atualmente, feitos 100% por IA. Mas a IA é limitada em termos de criatividade, ela só tende a homogeneizar o conteúdo, a fazer algo mediano”, enfatiza.
Golden partilha da mesma confiança. “Muitas vezes, acredita-se erroneamente que basta digitar 'Faça um sucesso de Hollywood'. Isso não é possível, precisa-se de uma visão”, enfatiza.
No entanto, há riscos de danos colaterais a serem evitados. Como, por exemplo, “a questão dos direitos de autor e a questão dos dados usados para treinar modelos [de IA]”, resume Carpentier.
E ainda há a questão da ameaça aos empregos. Jonathan Verk, diretor da Social Department, uma empresa de tecnologia dos EUA e moderador do Mipcom, explicou isso com humor ácido.
“Isto vai eliminar empregos? É claro que sim. Mas é uma boa notícia para nós porque haverá muitas pessoas em casa, vão precisar de mais programas e conteúdo para ver”, disse.
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