A cantora Ana Oliveira considera que portugueses e lusodescendentes radicados na Venezuela reagem ao jazz português de maneira sentimental e emotiva, associando-o com o fado.
“Na Venezuela, reagem de forma mais sentimental e emotiva. Aqueles que compreendem a língua reagem um bocadinho para além disso. Compreendem o texto e vão buscar e identificar os elementos com o que se está a passar. E a palavra, cantada em português, adquire aquela força que o fado já tem, porque as pessoas naturalmente associam ao fado e a receção é muito boa”, disse.
Ana Oliveira esteve na Venezuela, acompanhada pelo pianista João Pedro Coelho, para representar Portugal no III Festival Euro-venezuelano de Jazz, que reuniu ainda artistas da Espanha, França, Itália, Polónia, Suíça e do país anfitrião nas cidades venezuelanas de Caracas, Maracaibo e Margarita.
“Eu não tenho guitarra portuguesa na formação do grupo, não tenho o som instrumental que tem o fado, tenho um som muito mais próximo do usado tradicionalmente no jazz. E isso faz uma fusão e faz um som que é um pouco diferente do fado”, disse.
Admitindo, no entanto, que às vezes vai “roubar” algumas canções ao fado, explicou que “as pessoas reagem de uma forma identitária, identificam com o país”, que “esta procura de identidade começa no texto cantado em português” e que ela própria procura que as suas canções vão ao encontro das suas raízes.
Por outro lado, explicou que tem cantado “autores portugueses muito marcantes”, como o Sérgio Godinho, Zeca Afonso, José Luís Tinoco, Ary dos Santos, mas que recentemente decidiu fazer um bocadinho ao contrário e ir buscar textos portugueses, mas poesia original, do prémio Nobel da Literatura José Saramago, que, “apesar de não ser um poeta e não se considerar um poeta, tem dois livros muito bonitos, que se chamam os Poemas Possíveis e Provavelmente Alegria”.
“Fui investigar algumas daquelas poesias e imediatamente senti uma empatia gigante naquela maneira e naquelas palavras e ‘vi música’ quando estava a ler os textos. E o ímpeto foi fazer canções sobre aqueles poemas, uma recolha simbólica de alguns poemas de que gostei mais e que fiz música, escrevi a música, fiz os arranjos e editei um livro de partituras”, explicou, precisando que foi isso o que a levou à Venezuela: uma mistura, essa recolha da língua portuguesa no jazz.
Por outro lado, agradeceu a oportunidade de visitar a Venezuela, lidar com alunos das escolas de música locais e assistir a um concerto com a Simón Bolívar Big Band Jazz.
Ana Oliveira espera ter justificação e motivos para voltar mais do que uma vez à Venezuela, onde esteve a convite da Embaixada de Portugal e do instituto Camões.
“É importantíssimo que estas instituições façam todos os possíveis para continuar a fazer [isso], porque há muita coisa que falta dar a conhecer dos portugueses no mundo inteiro (…) portanto, é através destas instituições que depois os países percebem o que é que culturalmente está a acontecer e é possível contribuir bastante para a divulgação da música e arte portuguesa em geral”, concluiu.
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