George Lucas contou a uma audiência de Cannes na sexta-feira como teve que se esgueirar para a sua primeira estreia no festival de cinema francês e explicou por que os filmes "Star Wars" sempre foram para crianças.
O lendário cineasta de 80 anos também respondeu às críticas sobre a falta de diversidade nos seus filmes e refletiu sobre fazer clássicos de culto na década de 1970.
Lucas está na cidade para receber a Palma de Ouro honorária, uma versão do prémio principal do festival.
Apesar de ganhar muitos milhões de dólares nas bilheteiras, o realizador norte-americano nunca ganhou um Óscar competitivo no seu país natal.
“É sempre bom ser reconhecido”, disse.
“Obviamente temos muitos fãs e todo esse tipo de coisas. Mas em termos de prémios, não faço o tipo de filme que ganha prémios!”, explicou.
Estreia em Cannes
A primeira vez que Lucas veio a Cannes foi em 1971 para o seu filme de ficção científica vanguardista “THX 1138”.
Foi um fracasso de bilheteira e o estúdio Warner Bros recusou-se a pagar a sua viagem para França quando foi selecionado para o festival.
Lucas e Walter Murch, amigo e engenheiro de som do filme, pagaram as suas passagens, chegaram e descobriram que "chovia torrencialmente".
"Conseguimos assistir ao filme. Entrámos sorrateiramente. Não tínhamos bilhetes. Não tínhamos nada. Apenas entrámos", recordou, com Murch, também com 80 anos, novamente na audiência.
Questionado anos depois por jornalistas por que não apareceu na conferência de imprensa do seu filme, respondeu: “Não sabia que existia uma”.
"Star Wars"
"THX 1138" tornou-se "um filme de culto porque as pessoas consumiam LSD e viam-no", lembrou Lucas.
O seu próximo filme, "American Graffiti: Nova Geração", de 1973, também foi inicialmente odiado pelo seu estúdio, mas após vários testes entusiásticos com público, foi lançado nos cinemas em vez da TV e arrecadou mais 115 milhões nos EUA (valor da época).
Lucas lembrou como foi abordado por Allan Ladd Jr., um executivo da 20th Century Fox, oferecendo-se para fazer "o que você quiser... tem algum outro filme?"
"Disse: 'Bem, tenho esta espécie de fantasia de ficção científica maluca à moda dos anos 1930... cães a conduzir naves espaciais e outras coisas.'", contou.
Surpreendentemente, eles concordaram. O resto é história.
John Williams
Duh-duh-duh-duh... o fenómeno "Star Wars" provavelmente não existiria sem a sua banda sonora épica do compositor John Williams.
Quase não aconteceu, exceto pela intervenção de “Steve” – isto é, Steven Spielberg.
Spielberg recomendou que Lucas pensasse em Williams, que na época era conhecido na indústria mais como "um tipo do jazz".
Felizmente, Spielberg convenceu Lucas de que Williams poderia fornecer o tratamento clássico que desejava.
“Quando ouvi com a orquestra completa, pensei: 'Meu Deus'”, lembra Lucas.
"O som é metade do filme... é o molho secreto", defendeu.
O ódio às prequelas
Lucas regressou a “Star Wars” em 1999 com “Episódio I – A Ameaça Fantasma”.
“Os críticos e fãs que tinham 10 anos quando viram o primeiro... odiaram”, admitiu.
O cineasta comparou o ódio dirigido ao seu apatetado parceiro extra-terrestre Jar Jar Binks à antipatia inicial dos adultos pelo andróide C3PO e pelos fofinhos Ewoks, da trilogia original.
“'Star Wars' é para crianças de 12 anos”, garante, algo que sempre defendeu.
"É um filme infantil. Sempre foi um filme infantil", reforçou.
Críticas à diversidade
Lucas também rebateu as críticas a “Star Wars” por ser demasiado branco e masculino.
“A maioria das pessoas são extra-terrestres”, disse.
"Mesmo que sejam grandes e peludos, ou sejam verdes... a ideia é que todas as pessoas sejam iguais", notou.
Quanto às sugestões de que faltam mulheres nos filmes, Lucas perguntou: “Quem é que acham que são os heróis desses filmes?”
"O que acham que era a Princesa Leia? Ela é a líder da rebelião. É ela que agarra neste miúdo que não sabe de nada e neste tipo espalhafatoso que julga que sabe tudo e que não consegue fazer nada, e está a tentar salvar a rebelião com estes palhaços", recordou.
Abrir mão da saga
Lucas também defendeu a sua controversa decisão de voltar atrás e fazer alterações à sua trilogia original, usando a nova tecnologia digital para deixar os filmes como sempre quis.
“Acredito firmemente que o realizador, o argumentista ou o cineasta devem ter o direito de fazer com que o seu filme seja o que gostaria que fosse”, disse Lucas.
Sobre os filmes mais recentes após ter vendido a sua Lucasfilm à Disney em 2012 por 4,05 mil milhões de dólares, o cineasta tocou ao de leve, notando que se reformou há cerca de dez anos e já não sabe dizer muito bem como funciona agora Hollywood.
Mas soltou que os novos patrões erraram.
“Era eu que realmente sabia o que era 'Star Wars'… quem realmente conhecia este mundo, porque há muito nele. A Força, por exemplo, ninguém percebeu a Força”, disse.
E acrescentou: "Quando começaram outros após ter vendido a empresa, muitas das ideias que estavam no [original] de certa forma acabaram por se perder. Mas é o que acontece. Deixa-se ir, deixa-se ir. Agora está ao cuidado de outras pessoas".
Mais conciliador, ainda disse os novos projetos têm “muito talento, ótimas ideias e produção”.
“Sinto que vêm dos meus filhos, e às vezes dói um pouco quando crescem e se afastam de nós", admitiu.
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