"É uma visão mais abrangente do que aquela que o filme foi capaz de dar": quase 30 anos após o seu lançamento, o filme de culto “O Ódio” vai ser transposto pelo seu realizador Mathieu Kassovitz para um espetáculo musical, previsto para o outono de 2024.
Vinz, Saïd e Hubert, os três jovens de origem étnica distinta que deambulavam por Paris num estado de agitação provocado pela morte de um amigo às mãos da polícia, que se vai agravando a pouco e pouco até chegarem a um beco sem saída – Vincent Cassel, Saïd Taghmaouï e Hubert Koundé em 1995 no grande ecrã – serão interpretados por atores, dançarinos e cantores a partir de 10 de outubro de 2024 no La Seine Musicale, na região de Paris.
Estas figuras assumirão novos traços depois de um casting que contou com “cerca de três mil pessoas” para estes três papéis principais, explicou à France-Presse Mathieu Kassovitz, que se estreou como realizador com um filme que se tornou polémico devido à ambiguidade da exposição do fenómeno da violência urbana e dos bairros degradados das periferias.
O realizador e a sua equipa preparam há “dois anos” esta transposição para os palcos do seu trabalho que lhe valeu o prémio de Melhor Realização no Festival de Cannes e ganhou três César (os "Óscares franceses"), incluindo o de Melhor filme.
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O projeto já estava bem encaminhado no momento da morte de Nahel Merzouk, um jovem francês de 17 anos, de ascendência argelina e marroquina, a 27 de Junho, por um polícia durante uma operação de controlo de trânsito em Nanterre.
“A morte de Nahel é diferente [do que acontece no filme, nota do editor], foi filmada. Mas há 30 anos que sou contactado todos os meses para comentar um erro crasso, não é algo novo”, diz o realizador, que também encontrou aclamação como ator.
“Essas imagens lembram-nos a todos que nunca parou, por isso temos este cartaz. Diz “'O Ódio', até agora nada mudou”, revela.
"Até agora tudo bem"
Uma referência à famosa narração do filme: “É a história de um homem que cai de um prédio de 50 andares. O tipo, ao cair, repete constantemente para se tranquilizar: até agora tudo bem, até agora tudo bem..."
“Apesar de se chamar 'O Ódio', tratam-se de boas sensações, como no filme, tirando os últimos dez segundos [um final trágico, nota do editor]. Há emoção, riso, ritmo, pegamos as pessoas pelo colarinho, levamo-las numa jornada”, conta o realizador.
“Como todas as pessoas sabem o final, temos que encontrar outra forma de contá-lo, mas para isso temos uma distância de 30 anos, é uma visão mais ampla do que aquela que o filme foi capaz de dar”, esclarece.
As bilheteira para o espetáculo abrem já esta sexta-feira, às 10h00.
“A agenda está cada vez mais apertada, mas não estamos mal”, comenta “Kasso”, 56 anos, ainda a recuperar de um grave acidente de mota em setembro.
“Estou bem”, deixa escapar.
O espetáculo de 90 minutos – mais ou menos como a longa-metragem – deve envolver cerca de trinta dançarinos, cantores e atores. Serão cerca de 15 músicas originais criadas para a ocasião por cerca de dez artistas. Tudo em 14 segmentos.
"Uma mistura nunca vista"
"Para as pessoas do mundo da comunicação, não se deve dizer que é um musical porque parece um pouco piegas, mas é um musical no sentido em que conta uma história em músicas e canções, inspirada num filme que não o era", diz Mathieu Kassovitz.
O Seine Musicale foi recentemente o local do regresso à vanguarda da ópera rock “Starmania”. Mas as comparações ficam por aí no que diz respeito ao mestre construtor.
“É mais moderno do que um musical básico com cantores que chegam, que declamam: o hip-hop permite uma abordagem mais natural, logicamente que há uma troca na música, enquanto que em 'Os Chapéus-de-Chuva de Cherburgo' não há uma explicação quando as pessoas cantam no meio das cenas”, esclarece Mathieu Kassovitz, recordando a memória de um musical de Jacques Demy, um dos mais belos filmes do cinema francês e vencedor da Palma de Ouro do Festival de Cannes em 1964.
O realizador promete “interação com ecrãs, ecrãs que são cenários, cenários que se movem, uma mistura de tecnologia e ação ao vivo".
“É uma mistura nunca vista entre cinema e espetáculo ao vivo, não temos uma referência na equipa quando falamos disso entre nós: tentamos colocar o espectador no lugar da câmara, para que seja imersivo”, conclui.
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