Dois anos após o filme «Muto» surpreender tudo e todos no Cinanima – Festival Internacional de Cinema de Animação de Espinho, o argentino
BLU regressou, viu e venceu com
«Big Bang Big Boom» que arrebatou o Grande Prémio do certame. Tanto um como outro já tinham sido amplamente divulgados na internet o que é algo invulgar no cinema de animação mas se explica pelo facto de BLU ser um «graffitter» que também faz filmes, que são precisamente registos animados da sua actividade, em que cruza «street art» com animação «stop-motion» para criar filmes espantosos de movimento que têm fascinado todos quantos os têm visto. A arte de BLU, aliás, é bem conhecida dos lisboetas já que ele foi um dos «graffitters» que criou as espectaculares figuras que adornam os prédios devolutos da Avenida Fontes Pereira de Melo.
Quanto a cinema português, o grande vencedor foi
«Viagem a Cabo Verde», de
José Miguel Ribeiro, que já tinha dado nas vistas no DocLisboa, e que comprova mais uma vez que o seu autor é um dos mas talentosos realizadores de animação da Europa. Em registo documental, substituindo a técnica de animação de volumes que o celebrizara em
«A Suspeita» pela de desenho animado, graficamente excepcional, o filme recria a viagem que o seu autor fez às ilhas africanas em busca de si mesmo e de reencontrar um lugar na vertigem da sua vida, com o próprio Ribeiro dar voz à personagem que o ilustra.
Num ano em que, uma vez mais não houve vencedores consensuais (o que, de Portugal a Annecy, acontece com cada vez mais frequência no capítulo das curtas animadas), a colheita que mais surpreendeu coube precisamente à prata da casa, com um excelente lote de filmes portugueses em exibição. Logo à cabeça, além de «Viagem a Cabo Verde», o ano foi marcado pelo regresso de
Pedro Serrazina à realização, 15 anos após o marcante
«Estória do Gato e da Lua», e com um filme também ele de eleição:
«Os Olhos do Farol», plasticamente impressionante, que contrasta os efeitos realistas do mar com a estilização marcada das personagens, numa história de dor e redenção que envolve uma garota e o seu pai, e a relação destes com uma presença ausente mas sempre presente. Impressionante foi também o segundo filme de José Miguel Ribeiro na competição, o encantador
«Dodu – O Rapaz de Cartão», parte integrante de uma série pensada para a televisão, bem como o humor sempre desopilante de
«Raio XYZ», de
Joana Toste, a graça e inteligência de
«Afonso Henriques, o Primeiro Rei», de
Pedro Lino, a promessa revelada por
«Smolik», de
Cristiano Mourato, ou a escala e efeito de
«Desassossego» de
Lorenzo Degli’Innocenti.
Com a curiosidade do mar marcar presença num número significativo de filmes de competição oficial, a qualidade média da selecção foi razoavelmente alta, não deixando por isso de surpreender a escolha para Prémio Especial do Júri de
«In Scale», de
Marina Moshkova, e para Melhor Curta-Metragem para
«Teclopolis», de
Javier Marad, obras sólidas mas pouco surpreendentes. Pelo menos não tanto como os já bastante elogiados
«Lipsett Diaries», de
Theodore Ushev, ou
«The Lost Thing», de
Andrew Runeman e
Shann Tan, já premiados em vários eventos, tendo o último conquistado o galardão máximo do Festival Internacional de Cinema de Animação de Annecy.
O chinês
«Piercing 1», de
Liu Jian, foi distinguido como melhor longa-metragem, um filme bastante limitado ao nível da animação (feita praticamente só pelo próprio realizador) mas bastante interessante como documento revelador de uma certa marginalidade que circula pelas grandes metrópoles da China.
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