À partida, poder-se-ia dizer que a pele negra impediu
Lena Horne de ter uma carreira mais fulgurante no cinema, embora, em retrospectiva, as suas simpatias políticas a tenham lesado tanto ou mais que a cor com que nasceu. A sua voz levá-la-ia mais longe, tornando-a um símbolo da canção americana, mas o seu papel na luta pela igualdade racial também marcaria a sua imagem de mulher forte e esclarecida.
Horne nasceu em 1917 no seio de uma família de classe média-alta, com uma ascendência que cruzava sangue africano, índio e europeu. O seu arranque profissional deu-se logo aos 16 anos, em 1933, como dançarina e mais tarde cantora no mítico Cotton Club. Da voz viveria ao longo da década de 30, com cada vez mais notoriedade, surgindo pela primeira vez no cinema em 1938 no filme
«The Duke is Tops», um musical de baixo orçamento destinado à comunidade negra. É um dos filmes em que a intérprete, então com 20 anos, mais tempo aparece no ecrã, como interesse romântico do protagonista. Mais tarde, quando se tornou famosa, a película seria relançada com o título de «The Bronze Venus».
No início dos anos 40, Lena Horne fez história quando se tornou a primeira actriz negra a assinar contrato de longa duração com um grande estúdio em Hollywood, e logo com o maior de todos, a MGM. O seu primeiro filme foi
«A Loirinha do Panamá», adaptação do musical de Cole Porter «Panama Hattie», em que teve um pequeno papel. Porém, logo a seguir fez as duas películas pelas quais seria mais recordada, que tinham elencos totalmente afro-americanos e em que era co-protagonista. A primeira foi
«Tempestade Musical», em que contracenava a com nomes como
Bill «Bojangles» Robinson e
Cab Calloway, e cujo tema principal «Stormy Weather», transformou num enorme êxito. A segunda foi
«Um Lugar no Céu», a estreia na realização de
Vincente Minnelli, em que interpreta a mulher fatal enviada pelo inferno para afastar
Eddie «Rochester» Anderson do bom caminho.
Seguiram-se depois outros musicais da MGM (
«Até as Nuvens Passarem»,
«Os Reis do Ritmo»), em que surgia geralmente em números isolados, pensados para serem facilmente cortáveis quando os filmes fossem exibidos nos racistas estados sulistas dos EUA, que não exibiam películas em que negros tivessem uma condição que não fosse subserviente aos brancos. Por essa altura, Horne também deu muito que falar ao casar com Lennie Hayton, um homem branco e um dos principais maestros da MGM, num casamento inter-racial que terá então sofrido imensas pressões sociais.
Além da cor da sua pele, também as suas simpatias políticas na área da esquerda lhe condicionaram imenso a carreira, com a chamada «lista negra» do senador McCarthy a cortar trabalho em Hollywood a todos aqueles em que pairasse a suspeita de comunismo. Assim, com a carreira na música sempre em alta mas o percurso no cinema completamente estagnado, Horne dedicou-se cada vez mais à primeira via, tornando-se uma cantora ímpar, um símbolo da canção norte-americana.
Ao cinema, voltaria muito espaçadamente, e sempre em pequenos papéis: duas vezes nos anos 50 (
«A Duquesa Apaixonada» e
«Amor em Las Vegas»), uma em 1969, no «western» «Death of a Gunfighter», e outra em 1978, no musical
«O Feiticeiro», realizdo pelo seu cunhado
Sidney Lumet.
Pela música continuou sempre, tornando-se uma das mais requisitadas cantoras em espectáculos ao vivo, e continuando a gravar discos até aos anos 90, já dobrados os 80 anos de idade.
Além do seu legado enquanto intérprete, Horne foi também, desde muito cedo, extremamente activa na luta pela igualdade racial nos EUA, recusando-se a actuar para plateias em que os soldados negros fossem separados dos brancos durante a Segunda Guerra Mundial e participando na mítica Marcha Sobre Washington ao lado de Martin Luther King.
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