
Ao longo de 30 anos foram muitas as vidas dos Tara Perdida e o guitarrista Rui Costa (Ruka), atualmente também vocalista da banda, esteve em todas.
Em 10 de junho de 1995, ele, o vocalista e guitarrista João Ribas, o baixista Vitor Matos (Cró) e o baterista Hélio Moreira (Oregos) juntaram-se para um primeiro ensaio em Alvalade.
Cinco meses depois, em 17 de novembro, davam o primeiro concerto, no Grupo Dramático Ramiro José, na mesma zona de Lisboa, onde naquela época surgiram várias bandas.
Ruka tinha na altura 22 anos e "o sonho da música". "A cena das bandas era uma coisa muito ativa, não tem nada que ver com o que é hoje, que quase não se vê bandas a serem criadas. Tínhamos esse sonho. Foi dessa forma, com esse sonho, com a rebeldia, éramos todos uns rebeldes, [que criámos os Tara Perdida]", contou em entrevista à agência Lusa.
Em 1995, João Ribas já tinha carreira na música, tanto nos Censurados como nos Ku de Judas, e para Ruka "tocar com ele foi uma alegria".
O guitarrista Tiago Ganso entrou para os Tara Perdida um pouco depois, em 1999, mas acompanhava-os desde o início.
"Parávamos nos mesmos sítios. Eles iam ensaiar e eu ia para outro sítio, com o meu projeto. Naquela altura em Alvalade havia muitas bandas, qualquer miúdo de 20 anos queria tocar guitarra ou bateria, queria fazer barulho", recordou.
De todas as bandas que havia na altura, "99% morreram".
À época, sem redes sociais nem telemóveis, era ao Jardim dos Coruchéus e aos cafés de Alvalade que se deslocavam se quisessem encontrar amigos. Dali muitas vezes seguiam para o Bairro Alto ou para o Johnny Guitar.
Quando Tiago Ganso entrou na banda, já os Tara Perdida tinham editado dois álbuns: "Tara Perdida", em 1996, e "Só não vê quem não quer", em 1998.
O terceiro álbum da banda, "É assim", chegou em 2002. Foi o primeiro que gravaram com um produtor, Cajó, "até ali era 50 cervejas e mete a gravar", recordou Ruka.
"Não tínhamos noção da composição. Metíamos o que sabíamos. Fomos aprendendo como funcionava. Aprendemos muito com produtores - Cajó, Mário Barreiros. Sempre soubemos fazer isso: calar para ouvir quem sabe mais do que nós", referiu o músico.
Tiago Ganso partilha que de vez em quando ouvem músicas antigas e pensam: "Devíamos ter feito isto, não devíamos ter feito aquilo".
"'Por que é que ele não fez ali um 'break?' ou 'por que não fizeste assim ou assado?'. Mas naquela altura era impossível", disse.
Ruka considera que tudo isso "faz parte do crescimento". "Nessa idade mesmo que nos dissessem alguma coisa ia entrar por um ouvido e sair por outro”, afirmou.
Uma das melhores épocas da banda aconteceu em 2005, "na época do 'Lambe Botas' [álbum editado nesse ano]".
"Nesse ano ainda gravámos um DVD no Incrível Almadense. Esgotou, ficaram mais de mil pessoas cá fora, houve intervenção policial. Lembro-me que passámos bons momentos, até tocar com bandas americanas que nos tinham influenciado, eram ídolos. Era uma altura boa", partilhou Ruka lembrando que essa foi também a altura em que assinaram com uma 'major', a Universal, e gravaram o álbum "Nada a esconder", editado em 2008.
Nesse ano estavam "em alta" e ainda andaram uns anos assim. Faziam uma média de 40 concertos por ano, muitas queimas das fitas e receções ao caloiro, lembra Tiago Ganso. "Hoje as queimas não têm bandas de rock, nem uma", assinala Ruka.
E em 2014 aconteceu o pior momento da carreira da banda, "e para o resto da vida": a morte de João Ribas.
"É impossível dar a volta por cima de uma coisa dessas, mas acho que conseguimos enfiar a 3.ª e agora estamos em 4.ª um bocado", referiu Ruka.
Tiago Ganso reforça que a morte do vocalista os afetou "em tudo". "O nosso próprio caráter depois do que aconteceu mudou. Ficámos mais tristes, andámos pelo menos um ano a bater com as cabeças nas paredes. Já havia algumas coisas marcadas, levámos com a pressão do ‘fazem ou não fazem?’. Foram tempos difíceis", recordou.
A decisão foi continuarem. "Achámos que não era o momento certo [de desistir]. Até para a nossa sanidade mental. A paixão está igual e quanto mais subimos a palco, mais conseguimos homenagear o Ribas", referiu Ruka.
O músico reconhece que Ribas "era a imagem da banda". "Não é que estivéssemos na sombra, mas era. Hoje em dia somos os Tara Perdida", disse.
Trinta anos depois, os Tara Perdida são uma banda que "não é 'mainstream' nem 'underground'".
"Somos os Tara Perdida. Tocamos onde for. Se estiver o público para nos ver, está bom. As pessoas estão lá para nos ver, nós vamos. É isso que qualquer banda quer, ter o público à frente a cantar. E nós conseguimos ter isso", afirmou.
Em palco, vendem "uma energia".
"Temos boas canções, mas o que passamos é uma energia de verdade. As pessoas sentem que gostamos daquilo e essa é a verdade. E a mensagem é a luz ao fundo do túnel. Pode ser um comboio de carga a vir lá, mas às vezes não é", disse Ruka.
Ao fim de 30 anos concluem que "o truque é não desistir", mas "com trabalho, porque sem trabalho, esquece".
"Se estiveres à espera que caia não vai cair nada. Agora se trabalhares muito e não desistires, a sorte vai aparecer um dia. E depois também tens que te rodear das pessoas certas", afirmou.
Hoje e no sábado sobem ao palco da República da Música, em Alvalade, para celebrarem os 30 anos de carreira.
Além de Ruka e Tiago Ganso, estarão também em palco os outros dois membros da banda: o baterista Pedro Rosário (Kystos), que entrou em 2001 saiu em 2004 e regressou à banda em 2013, e o baixista Filipe Sousa, que se juntou em 2020.
Para se juntarem a eles convidaram "pessoas que estão de alguma maneira ligadas aos Tara Perdida", como Tim (Xutos & Pontapés), António Corte-Real (UHF), Samuel Palitos (Censurados, Ladrões do Tempo e a Naifa), João Pedro Almendra (Ku de Judas e Peste & Sida), Ivo Palitos e Vicente Santos.
"O Tim ajudou-nos em alturas difíceis. Fez o primeiro concerto logo após a morte do Ribas, em Santarém. Para nós foi bom, sentimos a força de alguém que é o vocalista da maior banda de rock portuguesa. Deu-nos mesmo força", recordou Ruka.
O alinhamento dos concertos irá incluir temas antigos, "alguns que já ninguém ouve ao vivo há muito tempo", mas também recentes, como "Tudo ou nada", divulgado na quarta-feira.
Na plateia contam ver muitos dos fãs de sempre, que no final dos anos 1990 eram miúdos de 20 anos, tal como eles.
Na véspera do 30.º aniversário, dia 09 de junho, estiveram a gravar o videoclip de "Tudo ou nada".
“É bom estar a trabalhar que nem um mouro. Ao fim de 30 anos ainda estou aqui da mesma forma", rematou Ruka.
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