A caminho dos
Óscares 2025
![Prémios Goya históricos: Melhor Filme... são dois.](/assets/img/blank.png)
Era 01h32 na cerimónia dos prémios Goya em Granada quando se registou um momento histórico e insólito: Belén Rueda abriu o envelope de Melhor Filme ao lado do realizador Alejandro Amenábar e dos atores Javier Bardem, Lola Duenas e Tamar Novas, toda a equipa de "Mar Adentro" reunida 20 anos depois, e anunciou "El 47".
Seguiram-se de imediato os festejos da equipa do filme quando a atriz abriu os braços para chamar a atenção e acrescentou, para espanto geral dos que estavam ao seu lado e do público, que era 'ex aequo' e se virou para a equipa de "La Infiltrada" para anunciar que também era vencedora.
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Por segundos, parecia a repetição na cidade andaluza do que aconteceu em Los Angeles nos Óscares de 2017, o da célebre confusão dos envelopes entre "La La Land" e "Moonlight, mas efetivamente a votação dos dois mil membros da Academia de Cinema de Espanha tinha levado a algo inédito nos 39 anos dos Goyas e após uns primeiros momentos de confusão, as equipas dos dois filmes juntaram-se em palco para celebrar e agradecer a decisão.
O ator Tamar Novas explicou o que se passou já nos bastidores: foi ele que percebeu que havia uma folha branca que dizia em letra muito pequena 'ex aequo' e, portanto, existia uma segunda cartolina dourada com "La Infiltrada" (percebe-se no vídeo que a atriz abre o envelope e tira a folha branca sem ver com atenção, agarrando pelo cimo, precisamente onde estava escrito o aviso).
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Tal como os Óscares, a cerimónia dos Goya estava prevista para três horas de duração e, entre discursos, atuações musicais, evocações especiais de "Mar Adentro" (vencedor de 14 Goyas e último Óscar de Melhor Filme Internacional de Espanha) e da falecida atriz Marisa Paredes, chegou quase às quatro: 'depois de uma cerimónia chata, começou o grande espetáculo, os fogos de artifício', descreveu o direto do jornal El País, destacando que foi uma gala de prémios 'estupendos' e 'discursos terríveis'.
Ambos inéditos em Portugal, "El 47" ganhou cinco prémios em 14 nomeações (Melhor Filme, Ator Secundário para Salva Reina, Atriz Secundária para Clara Segura, Supervisão de Produção e Efeitos Especiais), enquanto "La Infiltrada" teve dois em 13 (Melhor Filme e Atriz Principal para Carolina Yuste).
Eram os mais nomeados para os "Óscares de Espanha", mas o palmarés foi muito repartido, com "O Quarto ao Lado" a ganhar três categorias em 10 nomeações: Melhor Argumento Adaptado para Pedro Almodóvar, Fotografia e Banda Sonora, com Alberto Iglesias a aumentar o seu recorde como maior vencedor individual para 12 prémios.
O realizador alegou doença para cancelar a presença em cima da hora, mas o seu irmão Agustín leu o discurso, onde, evocando o tema da sua primeira longa-metragem em inglês, disse: 'Acredito que o ser humano deve ser dono da sua vida e também da sua morte quando a vida só lhe oferece dor."
VEJA O DISCURSO LIDO DE PEDRO ALMODÓVAR.
Para "Segundo Premio", filme sobre o grupo musical Los Planetas, também houve três prémios em 11 nomeações: Melhor Realização para Isaki Lacuesta e Pol Rodríguez, Montagem e Som.
Houve ainda dois prémios cada para "La Virgen Roja" (Direção Artística e Guarda-Roupa, em nove nomeações), "La Estrella Azul" (Melhor Ator Revelação para Pepe Lorente e Realizador Estreante para Javier Macipe, em oito), "Marco" (Melhor Ator Principal para Eduard Fernández e Caracterização, em cinco) e "La guitarra flamenca de Yerai Cortés" (fez o pleno: Canção Original e Documentário).
Com um prémio cada ficaram "Salve María" (Atriz Revelação para Laura Weissmahr), "Mariposas Negras" (Melhor Longa-Metragem de Animação), "Casa en llamas" (Argumento Original), "Cafune" (curta de animação), "La gran obra" (curta de ficção), "Semillas de Kivu" (curta documental), "Emília Pérez" (Filme Europeu) e "Ainda Estou Aqui" (Filme ibero-americana).
Os dois Melhor Filme
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“El 47”, dirigido por Marcel Barrena e protagonizado por Eduard Fernández (Goya de Melhor Ator, mas por "Marco"), conta a história de um motorista de autocarro de Barcelona, Manuel Vital, que decide fazer justiça pelas próprias mãos.
A verdadeira história sobre as lutas de bairro de Barcelona, ambientada numa favela da capital catalã na década de 1970, mostra “gente boa, como Manuel Vital, que lutou pela dignidade do seu povo”, disse um emocionado Barrena ao receber o principal troféu da noite.
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Já "La infiltrada", a companheira de pódio, é a história verídica de uma jovem polícia que conseguiu ser recrutado num dos comandos mais procurados da organização armada basca ETA.
Dirigido pela catalã Arantxa Echevarría, este 'thriller' foi o segundo filme espanhol de maior sucesso nas bilheteiras de 2024, com quase 1,3 milhões de espectadores e mais de 8 milhões de euros de receita.
Para a Melhor Atriz Carolina Yuste, é o segundo Goya da sua carreira, depois de ser Melhor Atriz Secundária por "Carmen y Lola" (2018), da mesma realizadora: aos 33 anos, confirma-se como um dos principais talentos da representação no país vizinho.
Numa noite em que foram ouvidas várias reivindicações em palco pela paz em Gaza e a favor da imigração, entre outras, Yuste pediu que fosse resolvida a crise imobiliária espanhola.
"Sou uma privilegiada, posso pagar o aluguer da minha casa. Por favor, mais uma coisa que vou pedir, o direito a uma residência digna para todas as pessoas", afirmou.
"Ainda Estou Aqui" também aclamado e um prémio para "Emília Pérez", apesar da polémica
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Na secção que premia o melhor filme latino-americano, confirmou-se o favoritismo do brasileiro "Ainda Estou Aqui", que está também nomeado para três Óscares, incluindo Melhor Filme.
O realizador Walter Salles dedicou o prémio ao "cinema brasileiro" através do músico uruguaio Jorge Drexler, que recebeu a estatueta, já que não esteve presente na cerimónia.
Lembrou, além disso, que a obra é sobre a memória de uma família "durante a longa noite da ditadura militar no Brasil".
O filme relembra a história do ex-deputado Rubens Paiva, que foi preso, torturado e morto pela ditadura brasileira em 1971, e da mulher, a ativista e advogada Eunice Paiva, que teve de retomar sozinha a vida familiar, com os filhos, e que tentou reclamar justiça pela morte do marido, cujo corpo nunca foi encontrado.
VEJA O DISCURSO LIDO DE WALTER SALLES.
Já "Emília Pérez" ganhou o Goya de Melhor Filme Europeu, no meio do escândalo desde 30 de janeiro envolvendo mensagens nas redes sociais de anos recentes da sua protagonista (a votação da Academia terminou a 24 de janeiro).
Nessas publicações, divulgadas por uma jornalista norte-americana, Karla Sofía Gascón descreveu o Islão como um "foco de infeção para a humanidade" e ironizou sobre o movimento antirracista após a morte de George Floyd, afro-americano morto pela polícia em 2020, entre outros temas.
O prémio foi recebido por Miguel Morales e Enrique Costa, representantes da distribuidora do filme na Espanha, que recordaram os mais de 250 mil espectadores que o viram nos cinemas (e como isso era importante), as muitas distinções recebidas desde a antestreia mundial no Festival de Cannes.
"Também é o filme não falado em inglês com mais nomeações aos Óscares, entre elas Melhor Filme e Melhor Atriz para Karla Sofía Gascón. Perante o ódio e o ridículo, mais cinema e mais cultura”, disseram.
VEJA O DISCURSO DOS REPRESENTANTES DE "EMÍLIA PÉREZ".
A imprensa espanhola especulava há algum tempo sobre a possibilidade de Gascón, que teve de cancelar a presença em vários eventos nos EUA, comparecer nos Goya. Mas a atriz, que vive perto de Madrid, acabou por não se deslocar a Granada.
O 'cancelamento' da atriz transgénero e a segunda espanhola nomeada para os Óscares depois de Penélope Cruz, foi, segundo o El País, o tema central das conversas nos bastidores e na passadeira vermelha, onde também se discutiu a ascensão da extrema direita e a diversidade dos filmes nomeados: dividiram-se opiniões e renovou-se o eterno debate sobre se é possível separar a arte do artista, a que se acrescentou outro, o de que até que ponto a transfobia afetou o escândalo.
O realizador J.A. Bayona (vencedor no ano passado com "A Sociedade da Neve") considerou que 'Karla equivocou-se, as suas mensagens são indesculpáveis', mas criticou o 'linchamento' a que foi submetida.
Presente na cerimónia, o presidente do Governo espanhol, o socialista Pedro Sánchez, evitou nomear Gascón, mas destacou 'os aspetos positivos de uma sociedade espanhola que abraça sempre este tipo de valores, o da diversidade, do respeito, da tolerância'.
Richard Gere critica Trump
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O ator norte-americano Richard Gere recebeu o Prémio Goya Internacional honorário e carregou nas críticas a Donald Trump.
"Venho de um lugar onde estamos num momento muito sombrio, os EUA, onde temos um rufia, um criminoso, que é o presidente dos EUA. Mas não é apenas nos EUA, está em toda parte [...]", disse o ator de 75 anos durante o discurso em inglês.
O ator de filmes como "Dias do Paraíso", “American Gigolo”, "Oficial e Cavalheiro", "Cotton Club", “Pretty Woman - Um Sonho de Mulher" e "Chicago" já criticara Trump em termos fortes durante uma conferência de imprensa na sexta-feira em Granada, a cidade que recebeu a cerimónia.
No sábado, foi Antonio Banderas quem entregou o prémio honorário pela 'sua extraordinária contribuição à arte do cinema' e o seu ativismo social com diversas causas, incluindo a situação dos refugiados e os deslocados.
Durante o seu discurso, Gere alertou para o 'casamento sombrio' entre poder e dinheiro 'como nunca vimos antes'.
E acrescentou: 'O facto de estes irresponsáveis e talvez perigosamente corrosivos multimilionários estarem a comandar tudo na América neste momento é um perigo para todos neste planeta.'
A qualidade das legendas em castelhano na transmissão da gala na TVE foi muito criticada nas redes sociais em mensagens à Academia de Cinema, que confirmou ao El País que uma pessoa traduziu o discurso em simultâneo e que o ator não entregou previamente um texto à organização, avisando que iria improvisar.
Gere é também um defensor de longa data da causa do Tibete, que se reuniu frequentemente com o Dalai Lama, o líder espiritual tibetano exilado que Pequim acusa de fomentar o separatismo na região dos Himalaias.
No ano passado, Gere e a sua esposa espanhola, a publicitária Alejandra Silva, de 41 anos, mudaram-se para Madrid com os dois filhos.
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