É tudo mentira e o verdadeiro obcecado é Richard Gadd, alega a mulher que deu a cara numa entrevista a Piers Morgan como a verdadeira 'Martha', a perseguidora de "Baby Reindeer".
Baseada na laureada peça a solo que conquistou o Festival Fringe em Edimburgo, a minissérie de oito episódios da Netflix tornou-se um fenómeno de popularidade e viral desde o lançamento a 11 de abril: a história, inspirada em factos verídicos, acompanha o esforçado humorista Donny Dunn (Gadd) na sua relação deturpada com Martha (Jessica Gunning),uma perseguidora e o impacto que esta ligação tem sobre ele ao acabar por obrigá-lo a enfrentar um trauma reprimido.
Durante o programa "Piers Morgan Uncensored", transmitido na quinta-feira à noite no YouTube, a escocesa Fiona Harvey, de 58 anos, que se apresenta como uma advogada, confirmou que a série se baseia nela, mas nega ter amado, perseguido e agredido sexualmente o humorista, atacado a sua antiga namorada ou contactado os seus pais.
Apesar do sucesso global, Harvey diz que evitou ver "Baby Reindeer", mas descreveu à mesma como um 'obsceno' e 'difamatório' trabalho de ficção e que se viu “forçada” a contar a sua versão da história depois de receber ameaças de morte dos 'detetives da Internet' que descobriram a sua identidade.
Acusando-o e à Netflix de mentirem, negou repetidamente ter sido presa ou perseguido Gadd durante anos com 41 mil emails, 350 horas de mensagens no 'voicemail', 744 'tweets', 48 mensagens no Facebook e 106 cartas, garantindo estar preparada pela ir a tribunal defender-se de uma trabalho que descreve como “uma obra de ficção, uma obra de hipérbole”.
Evasiva em várias respostas e vaga nos pormenores apesar de dizer que tem uma 'memória fotográfica', admitiu ter quatro telemóveis e seis endereços de email, mas diz que provavelmente mandou ao humorista 'menos de dez emails', 'uma carta' e talvez 'cerca de 18 tweets'.
“Há dois factos verdadeiros naquele [programa]: o nome dele é Richard Gadd e trabalha como barman em Hawley Arms”, disse.
Questionada sobre o que gostaria de dizer a Gadd, respondeu: 'Por favor, deixa-me em paz, arranja uma vida, um emprego a sério, estou horrorizada com o que fizeste'.
"Sinceramente, é tudo uma trapalhada"
Desde a transmissão na quinta-feira que a entrevista, gravada dois dias antes, está a gerar muita controvérsia, com elogios ao profissionalismo de Piers Morgan e do seu programa, mas também acusações de serem 'profundamente irresponsáveis' e estarem a aproveitar-se de Harvey, que vários espectadores nas redes sociais dizem ter mostrado os sinais de 'perturbação delirante' retratados em "Baby Reindeer".
Gabando-se dos quatro milhões que viram a entrevista até agora, Morgan prometeu voltar ao tema no seu programa desta sexta-feira, dando a sua opinião sobre se a advogada disse a verdade e com convidados a reagir às declarações.
Mas num artigo publicado no The Sun ao mesmo tempo que começava a entrevista na quinta-feira, o jornalista e comentador diz que existem pormenores, como o facto de nunca ter sido acusada ou condenada de qualquer crime, que apontam para "uma falha espetacular no dever de cuidado por parte da Netflix, Gadd e da Clerkenwell Films, que produziu a série, o que acho que acarreta sérios riscos legais".
"Claro que nada disto significa que a Fiona Harvey me contou a verdade. Achei-a inteligente, de raciocínio rápido e combativa. E a um nível humano, senti pena dela por ter sido arrastada publicamente assim pela trituradora", escreveu.
Acrescentou que o comportamento em geral à frente ou atrás das câmaras não deram a si ou à sua equipa "qualquer motivo de preocupação sobre o seu potencial perigo ou o seu estado mental, embora deva ser dito que os perseguidores podem ser muito convincentes na sua capacidade de esconder as suas verdadeiras personalidades ou intenção obsessiva".
"Mas houve momentos na entrevista em que os meus alarmes de desconfiança soaram alto, especialmente quando ela disse de repente ‘Mesmo que a coisa do e-mail fosse verdade, o resto não é’. A ‘coisa do e-mail’ são os 41 mil emails que se diz que ela terá enviado a Gadd. E se isso for verdade, então sugere que ela estava a procurar obsessivamente um contacto com ele. Também achei muito estranho que admitisse ter até seis endereços de e-mail e quatro telemóveis que ‘usava para pessoas diferentes’. Isso não é normal", nota.
E acrescenta: "Ela também fez uma série de negações categóricas gerais sobre há quanto tempo conhecia Gadd e até que ponto tinha contacto com ele que são comprovadamente falsas. A alegação de que apenas lhe enviou uma carta, quando ele diz que tem 105, parece bastante falsa".
"No geral, diria que a Fiona Harvey me mentiu bastante na entrevista e se a sua ameaça de uma ação legal contra a Netflix e Gadd avançar, suspeito que se descobrirá rapidamente que ela lhe enviou todos os e-mails, mensagens e cartas", diz.
"Mas isso não significa que ela não possa também ser uma vítima aqui. Gadd, como ele mesmo admite, é um tipo muito perturbado que consumiu muitas drogas, procurou com entusiasmo uma vida sexual caótica e sinistra, e lidou com a Martha de uma forma que pode ter alimentado a sua obsessão", referiu, recordando que a sua conduta profissional também foi colocada em causa por alegadamente ter feito investidas amorosas junto de atrizes transgénero que fizeram testes para conseguir trabalho na série.
"Sinceramente, é tudo uma trapalhada", concluiu.
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