A quase totalidade dos músicos portugueses (95,44%) considera injusta a maneira como são distribuídas as receitas das plataformas de streaming, de acordo com um estudo hoje divulgado.
Além de considerar a repartição das receitas injustas, a maioria dos músicos portugueses está insatisfeita (23%) ou muito insatisfeita (57%) com as receitas que recebe através da divulgação do seu trabalho nas plataformas de streaming.
Os dados constam do estudo “O Impacto da Diretiva MUD nos Artistas e Músicos da UE”, levado a cabo cinco anos após a aprovação no Parlamento Europeu da diretiva da União Europeia (UE) sobre o Direito de Autor no Mercado Único Digital (MUD), que foi transposta para a lei portuguesa no ano passado.
Coordenado a nível europeu pela organização de artistas AEPO-ARTIS, que representa cerca de 700 mil artistas do audiovisual e música, o estudo foi promovido em Portugal pela GDA, entidade que gere os direitos de propriedade intelectual de atores, bailarinos e músicos, e envolveu uma amostra de 9.542 artistas de 18 países europeus, dos quais cerca de mil portugueses.
De acordo com a GDA, num comunicado hoje divulgado, o estudo, “que contou ainda com a colaboração da Organização Internacional dos Artistas, foi o maior estudo de opinião alguma vez levado a cabo em toda a União Europeia sobre questões relacionadas com artistas da indústria musical”.
A perceção dos músicos portugueses contrasta com a de artistas de outros países, como a Letónia ou a Suécia, onde 27,72% e 20,17% consideram justa a maneira como são distribuídas as receitas das plataformas de streaming. Em Portugal essa percentagem é de 4,56%.
Estes resultados não surpreenderam o presidente da GDA, Pedro Wallenstein, para quem “essas discrepâncias explicam-se com a qualidade díspar das transposições da diretiva em cada Estado-membro” da União Europeia, referiu, citado no comunicado.
“Em Portugal, a transposição ficou muito aquém do espírito da diretiva, ao ter permitido que muitos artistas ficassem sem receber qualquer parcela dos rendimentos gerados pelas suas obras no mercado digital”, defendeu Pedro Wallenstein.
Dos músicos portugueses que participaram no estudo, 34% têm contratos com editoras. Destes, apenas 8,05% pediu um aumento dos ‘royalties’ (pagamentos feitos ao dono dos direitos de autor de uma obra musical) à editora com quem tem contrato, e 7,44% tentou recuperar os direitos que estão na posse das editoras.
A diretiva europeia n.º 2019/790 visa a necessidade de regular o uso de obras autorais em ambiente digital.
O objetivo é a proteção da titularidade dos conteúdos de artistas, músicos, escritores e jornalistas na Internet, criando regras para a utilização do seu trabalho por terceiros, nomeadamente nas diferentes plataformas na rede.
Nos termos globais da legislação europeia, gigantes tecnológicas como a Meta ou Alphabet passaram a ter responsabilidades para assegurar o respeito pelos direitos de autor.
Aprovada ao nível da União Europeia em 17 de abril de 2019 e aplicável desde junho desse mesmo ano, a diretiva deveria ter sido transposta para a legislação de cada Estado-membro até dia 07 de junho de 2021.
Em maio de 2022, a Comissão Europeia enviou dois pareceres fundamentados a Portugal, na fase inicial de um processo de infração, por ainda não ter notificado Bruxelas sobre a transposição das diretivas.
O diploma 47/2023, que transpõe a diretiva 2019/790, foi publicado em Diário da República em 19 de junho do ano passado, após ter sido aprovado por via governamental e depois de ouvido em audição o Conselho Nacional do Consumo.
Para o presidente da GDA, Pedro Wallenstein, o estudo “O Impacto da Diretiva MUD nos Artistas e Músicos da UE” “revela a necessidade premente de se reabrir na Europa e, especialmente em Portugal, a discussão em torno da diretiva”.
Já o secretário-geral da AEPO-ARTIS, Ioan Kaes, também citado no comunicado, considera que o estudo “deveria ser leitura obrigatória para os governos nacionais em toda a UE e na restante Europa (incluindo o Reino Unido)”.
“Os legisladores devem olhar para o impacto diminuto desta diretiva e proceder às mudanças legislativas necessárias para garantir que o objetivo principal da diretiva – remuneração justa – seja alcançado”, defendeu.
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