Do escritor Julian Fellowes, a mente intriguista e novelesca por detrás do mistério de "Gosford Park" (Robert Altman, 2001), surgiu uma das séries mais importantes e revitalizadoras dos costumes da aristocracia britânica: "Downton Abbey".

Com seis temporadas, Globos de Ouro, Emmys e uma legião de fãs, esta série inglesa saiu da televisão em alta, com um legado estrondoso e uma aspiração futura: o grande ecrã e uma narrativa única ao nível dos romances, escândalos e mistérios da família Crawley.

A premissa escolhida foi a mais adequada para encher de novo a casa senhorial: o Rei George V e a Rainha Mary estão de visita e com eles irão trazer todo o protocolo vigente da época... bem como os seus mordomos, valetes, cozinheiros e serventes. Algo que irá pôr as paredes a rangerem de intriga, mesquinhez e tensão, num drama eloquente e luxuoso, intrincado e cómico, apaixonado e nostálgico... feito para os fãs.

Com uma produção suportada por uma exatidão histórica e paixão pelo detalhe, bem patente no guarda-roupa, caracterização, design de produção, entre outros, a narrativa é perfumada e acompanhada com elegância pela câmara do realizador Michael Engler, que capta os atores em perfeita dança de movimentos, citações e correria.

Não há tempo a perder pelos corredores, enquanto a azáfama toma o seu lugar, abraçando toda a teia de relações guiada pela economia de diálogos e precisão de Julian Fellowes.

A versão cinematográfica que agora estreia é a epítome de tudo o que conhecemos da série: o maquiavelismo "one liner" de Violet Crawley (Maggie Smith) que nunca reconhece a derrota; as indecisões de Lady Mary (Michelle Dockery); a dúvida sobre o impulso político de Tom Branson (Allen Leech); a rebeldia de Bates (Brendan Coyle) e Anna (Joanne Froggatt) e o orgulho da equipa de Mr. Carson (Jim Carter), que não se escusa de fazer frente aos emproados serviçais da família real; a contínua descoberta homossexual de Thomas Barrow (Robert James-Collier); a alegria tonta de Molesley (Kevin Doyle), que se irá desgraçar em frente da família real.

É claro que num filme com mais de duas dezenas de papéis, se iria sempre sentir um apressar de eventos, e este acaba por se desenrolar como dois episódios da série unidos. Como devido, já que o filme é para os fãs: as nossas personagens não são apresentadas e a sua índole é traçada em curtos traços, servindo para fazer avançar o argumento e dar-nos oportunidade de vivermos de novo neste microcosmo de código peculiar.

Quatro anos volvidos o final da série, a viagem de "Downton Abbey" tem aqui o seu verdadeiro final com decoro, decência, pompa e circunstância e, mais do que tudo, respeito e agradecimento aos seus (muitos) admiradores.

"Downton Abbey": nos cinemas a 19 de setembro.

Crítica: Daniel Antero

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