Don Hahn, produtor de filmes como
«Quem Tramou Roger Rabbit?»,
«A Bela e o Monstro» e
«O Rei Leão» esteve no vórtice do furacão que, no final dos anos 80 e princípios de 90, provocou o renascimento da animação cinematográfica (da Disney e, por extensão, de todo o cinema), uma história de sucesso quase sem paralelo em Hollywood:
Em 1985 a grande aposta do estúdio,
«Taran e o Caldeirão Mágico», foi batida nas bilheteiras pelo filme
«Ursinhos Carinhosos», e o departamento de animação estava prestes a fechar; em 1992,
«A Bela e o Monstro» batia recordes de bilheteira e cometia a proeza de ser nomeado ao Óscar de Melhor Filme. Dois anos depois,
«O Rei Leão», tornava-se um dos maiores sucessos da história do cinema.
Foi um período complexo, de transição de gerações e de choque de egos, que Hahn resolveu dar a conhecer no documentário
«Waking Sleeping Beauty», que ele próprio realizou, durante o
Festival Internacional de Animação de Annecy (a decorrer até 12 de Junho), foi ontem apresentado pelo próprio na companhia de
John Musker e
Ron Clements, a dupla de realizadores responsáveis por
«A Pequena Sereia»,
«Aladdin», e
«A Princesa e o Sapo». No final da projecção, o trio foi aplaudido de pé.
Hahn explicou que tinha duas regras muito claras à partida quando fez
«Waking Sleeping Beauty»: não seria um filme sobre velhotes a recordarem o passado e utilizaria apenas imagens de época, todas anteriores a 1995, data em que o filme encerra. Assim, o sabor da altura por vezes é captado com imagens de reportagens televisivas, entrevistas de época e vídeos pessoais dos próprios animadores, contextualizados por narrações actuais de alguns dos participantes.
A história arranca no final dos anos 70, com um grupo de alunos do California Institute of the Arts (CALArts) fascinados pela animação e frustrados com os caminhos pouco criativos que o estúdio então tomava: entre eles contavam-se os referidos John Musker e Ron Clements, mas também os hoje lendários
Glen Keane,
Brad Bird,
John Lasseter,
Andreas Deja e até
Tim Burton.
Com o estúdio à beira de ser dissolvido, surge uma nova liderança por via de
Roy E. Disney, sobrinho de
Walt Disney, que consegue impor
Michael Eisner como director da empresa e
Jeffrey Katzenberg (hoje dirigente da DreamWorks) como seu homem de mão. Executivos aguerridos e modernos, ambos conseguem acordar o estúdio do seu torpor e colocá-lo de volta nos carris, apesar da sede de sucesso e do choque de egos frequente. E se todas as vertentes empresariais da Disney floresceram, foi o renascimento da animação que mais surpreendeu, a níveis nunca antes atingidos.
Com
«Quem Tramou Roger Rabbit?»,
«A Pequena Sereia»,
«A Bela e o Monstro»,
«Aladdin» e
«O Rei Leão» a serem produzidos em rápida sequência, a Disney passou de um estúdio dado como moribundo alguns anos antes para o local de onde saíam maravilhas animadas sem paralelo, com sucessos de bilheteira nunca vistos e muitos Óscares na prateleira.
Foi um período exuberante e difícil, onde todos foram puxados quase até aos limites, com o confronto de personalidades em crescente agudização e duas perdas que acabariam por ditar o refrear dessa idade de ouro: o compositor
Howard Ashman, vítima de Sida, e o director financeiro da empresa
Frank Wells, num acidente de helicóptero, que era o ponto fundamental de equilíbrio entre Eisner e Katzenberg, que sairia da empresa pouco depois para fundar a DreamWorks.
«Waking Sleeping Beauty» recorda uma história cheia de sonhos e conquistas, mas também de angústias e egos gigantescos, imprescindíveis numa história com este tipo de sucesso. O filme não escamoteia as partes mais negras, com Jeffrey Katzenberg a ser retratado como um executivo que pouco percebia de animação e só pensava em números, embora sendo-lhe reconhecida a importância fundamental no sucesso último do estúdio.
Curiosamente, alguns minutos após o final da projecção de «Waking Sleeping Beauty», o próprio Katzenberg, que deu o seu aval ao documentário e também está presente este ano no
Festival de Annecy, começava a apresentar na sala ao lado a primeira exibição europeia do quarto filme da série
«Shrek».
«Waking Sleeping Beauty», onde surgem, de forma directa ou indirecta, alguns dos nomes mais importantes da animação norte-americana do último quarto de século, teve uma estreia limitada em Março nos EUA e deverá estrear brevemente em França e alguns países da Europa.
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