"Caught By The Tides", de Jia Zhangke, é uma história de amor de décadas que está a concorrer à ilustre Palma de Ouro do Festival de Cinema de Cannes.
É uma reflexão meditativa sobre o cinema, a passagem do tempo e as profundas mudanças que a China viveu nos últimos 25 anos.
o realizador de 53 anos disse à France-Presse (AFP) que a decisão de fazer o seu filme pouco ortodoxo foi motivada pela pandemia de COVID-19, que dificultou as rodagens na China.
Ele decidiu revisitar as filmagens feitas nas últimas décadas, algumas das quais foram originalmente filmadas sem nenhum propósito específico, enquanto Jia e sua equipa experimentavam diversas técnicas.
“Durante a montagem, de repente percebi que teria que considerar todas as filmagens que fiz nos últimos 20 anos como material potencial”, disse.
“Foi assim que este filme foi finalmente formado”, nota.
Efetivamente, cerca de 10 cenas de "Caught By The Tides" apareceram nos seus filmes anteriores.
Mas, insiste, “para mim, é uma nova história, uma nova compreensão do mundo e um processo de recriação de uma nova personagem, Qiao Qiao”.
O filme começa no início dos anos 2000 nos arredores sombrios e empobrecidos da cidade de Datong, no norte da China, onde Qiao Qiao (Zhao Tao) e Guao Bin (Li Zhubin) se conhecem e apaixonam.
Guao Bin decide tentar a sorte noutra parte do país em rápida industrialização. Qiao Qiao inicialmente espera, antes de partir à sua procura.
O filme avança, muitos anos de cada vez.
Antes e depois
Qiao Qiao é interpretada pela esposa de Jia, Zhao Tao, que protagonizou muitos dos seus filmes.
Devido ao método incomum de produção, Zhao, juntamente com outros atores que regressam, envelhece cerca de 20 anos na vida real à medida que a narrativa avança.
Uma secção final, ambientada na China contemporânea, foi filmada durante a pandemia.
“Fiquei um pouco inquieta”, disse Zhao à AFP.
“O que me preocupou não foi o presente, mas sim as minhas atuações anteriores. Não me lembrava como as tinha feito", esclareceu.
“Mas quando vi as minhas cenas anteriores na sala de montagem, percebi que minhas preocupações poderiam ser dissipadas. Desde o início, sempre tive a sorte de colocar a personagem em primeiro plano”, conta.
Parte do filme usa imagens inicialmente filmadas tendo como pano de fundo a construção da Barragem das Três Gargantas.
Esse vasto projeto, que deslocou mais de um milhão de pessoas, é um assunto que há muito fascina Jia, sintetizando a transformação a uma velocidade vertiginosa da China no início do século XXI.
Foi também o tema do seu "Natureza Morta" de 2006, que lançou Jia para a maior aclamação internacional ao ganhar o Leão de Ouro no Festival de Cinema de Veneza, e "As Cinzas Brancas Mais Puras", de 2018, depois de se fazer notar com "Plataforma", de 1999.
Para Jia, a concretização do filme marca o fim desse capítulo da sua carreira.
“Por um lado, este filme representa uma retrospetiva e uma reconstrução do meu passado”, disse.
“Ao mesmo tempo, acho que é uma mudança inevitável para todos. Tenho a impressão de que o mundo foi dividido entre um antes e um depois dos anos 2000”, conclui.
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