A ficção “Maria”, uma perspetiva atual sobre a traumática rodagem de “O Último Tango em Paris” (1972), que estragou a vida da atriz francesa Maria Schneider, é apresentada esta terça-feira no Festival de Cannes, em plena vaga #MeToo.
Num contexto no qual se tornou prioritário estabelecer protocolos relativos às condições de rodagem, cenas íntimas e atores menores, a realizadora Jessica Palud ambienta a sua história no início dos anos 1970, quando os cineastas tinham muito poder e o consentimento das atrizes não era importante.
Filha ilegítima de um ator famoso, a jovem Maria sonha em fazer cinema e é escolhida aos 19 anos para filmar ao lado de Marlon Brando, protagonista de "Um Eléctrico Chamado Desejo" e "Há Lodo no Cais", uma paixão tórrida entre um viúvo americano de passagem por Paris e uma jovem, sob a direção de Bernardo Bertolucci.
A história mórbida atinge o seu clímax com uma cena de violação em que a manteiga é usada como lubrificante, o que fez com que o filme fosse classificado apenas para adultos e recebesse críticas do Vaticano.
Embora falsa, a cena foi imposta à atriz sem que soubesse de nada e acabou arrasando a intérprete, como explica a sua prima, a jornalista Vanessa Schneider, em “Tu t’appelais Maria Schneider” ("O Seu nome era Maria Schneider", em tradução livre), o livro que inspirou Palud.
María Schneider não hesitou em falar sobre uma dupla violação, por parte de Brando e de Bertolucci, e disse que as lágrimas vistas no ecrã são dela e não da personagem.
“O que me comoveu foi esta mulher que, nos anos 1970, falava, dizia coisas e ninguém parecia ouvir a sua voz, e as suas frases eram finalmente frases em 2024”, disse a Palud à France-Presse.
“Há algo de muito moderno” no que ela dizia", acrescenta..
A atriz, falecida em 2011, não conseguiu superar o filme escandaloso e sucumbiu às drogas. A sua carreira foi muitas vezes reduzida a "O Último Tango em Paris" e à sua famosa cena.
Para interpretar Schneider, Palud escolheu Anamaria Vartolomei, descoberta em “O Acontecimento”, filme sobre o aborto que ganhou o Leão de Ouro em Veneza em 2021. Matt Dillon é Brando e Giuseppe Maggio é Bertolucci.
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