Aos 39 anos, o francês
Louis Leterrier tem razões para estar feliz. Depois de assistir
Jean-Pierre Jeunet em
«Alien: O Regresso» e
Alain Chabat em
«Astérix e Obélix: Missão Cleópatra», lançou-se numa carreira de realizador de fitas de ação europeias, produzidas por
Luc Besson, que integrou os dois primeiros
«Correio de Risco» e o perturbante
«Danny the Dog - Força Destruidora». De seguida, quis concretizar o sonho americano e conseguiu-o: deu o alto para Hollywood, onde assinou os «blockbusters»
«O Incrível Hulk» e
«Confronto de Titãs». O seu mais recente filme,
«Mestres da Ilusão», voltou a ser um êxito, e juntou um elenco de luxo (
Jesse Eisenberg,
Isla Fisher,
Dave Franco,
Woody Harrelson,
Michael Caine,
Morgan Freeman,
Mark Ruffalo e
Mélanie Laurent) numa fita cheia de reviravoltas sobre ilusionistas que praticam assaltos espetaculares.
A ideia de fazer um filme sobre ilusionistas que usam os seus dons para fazer assaltos parece óbvia... Mas o surpreendente em que nunca parece ter sido tentada em cinema.
Não, nunca foi, em qualquer filme, tanto quanto sei. É uma daquelas coisas estranhas e bizarras, porque a ideia é tão boa e o conceito é tão forte que é espantoso como ninguém antes pensou nisso. Há muitas ideias assim em Hollywod e esta era uma delas. Foi uma sorte para mim, era completamente óbvio por isso é que eu fiquei logo tão entusiasmado com o projeto. E ainda por cima era um filme que permitia unir a magia à narrativa cinematográfica, porque parte do desafio é mesmo esse, conseguir transmitir tudo aquilo pela linguagem do cinema.
E estamos sempre a falar de ilusionismo, não há nada de sobrenatural por ali. Não se trata de um filme fantástico.
Exatamente, era muito importante para nós que os truques fossem 100% reais. Mesmo que não fosem concretizáveis agora, teria de haver alguém a trabalhar neles para torná-los possíveis. Como na cena em que Isla Fisher voa dentro de uma bolha, que hoje ainda não é possível de fazer mas que há ilusionistas a trabalhar nela. A ideia era pegar em truques que existem e que pudessem ser usados, tendo em conta que estávamos a falar dos maiores mágicos do mundo, o que permitia amplificar a coisa. Eram os quatro maiores ilusionistas, a trabalhar em conjunto e com alguém a ajudá-los, mas sem nada de propriamente fantástico ou sobrenatural.
O argumento tem muitas surpresas e reviravoltas e está construído de forma muito engenhosa. Foi difícil encaixar as peças todas?
Sim, isso foi o mais difícil, todas elas encaixam umas nas outras, mas deu mesmo muito trabalho. Nós tínhamos um excelente início, sabíamos em que direção queríamos ir e tivemos de trabalhar muito e muito para lá chegar. O argumento original já era bom, só que quando começamos a trabalhar nele no terreno há muitas coisas que acabam por ser alteradas por questões práticas. Por exemplo, se chove num dia de gravação de exteriores e essa cena tem de passar para um cenário interior, então tem de se ter atenção a todas as interações entre as personagens porque basta uma pequena alteração para criar um buraco no argumento, que é preciso preencher e resolver antes de seguir em frente. Na verdade, é um pouco como fazem os mágicos, que têm sempre planos de contingência para as várias situações que podem surgir, e que aproveitam quando o acaso ou a sorte lhes permite um atalho ou até um desvio para que o truque fique melhor.
O elenco é excelente, e inclui nada menos que oito estrelas. Foi difícil juntá-las?
Bom, eu já tinha trabalhado com o Morgan Freeman no «Danny the Dog» e já conhecia o Mark Ruffalo. Mas tudo se torna mais fácil quando há um grande conceito e um grande argumento, e isso nós tínhamos. Depois, neste tipo de filme-coral, é preciso convencê-los de que eles não vão ficar desamparados, que fazem parte de um conjunto, e aí depende muito de quem entrar no filme. Os dois pontos mais importantes no «casting» deste filme, para nós, eram o ilusionista principal e o polícia, e quando o Jesse Eisenberg e o Mark Ruffalo aceitaram os papéis, o resto foi sendo mais fácil, porque muito atores queriam também trabalhar com eles. Depois foi só ir somando os nomes.
Vindo do cinema francês, em que o realizador é uma entidade todo-poderosa nos destinos do filme, como foi dar o salto para Hollywood, em que os estúdios interferem muito mais no trabalho criativo?
Os estúdios não são propriamente difíceis. Toda a gente quer fazer o mesmo filme, só que eles têm tendência para insistir em tentar todas as opções possíveis até chegar à certa, ao passo que nós enquanto realizadores já temos uma visão clara das coisas e poupamo-nos a isso. O estúdio está muito ocupado, a fazer sete filmes ao mesmo tempo. Não é que eles não gostem do nosso trabalho, como eu pensava no início, é que eles colocam-se no lugar dos espectadores e pensam naquilo que irá atrair o maior número de pessoas às salas para ver aquele filme. Ninguém tenta destruir a fita, toda a gente quer torná-la melhor, portanto se entrarmos com esta atitude, apreciamos o processo. Mas claro que, dito isto, quando trabalhamos seis meses numa versão e depois nos dizem que não funciona, isso magoa. Mas depois temos de pôr o nosso ego de lado e fazer a coisa funcionar.
O «Mestres da Ilusão» foi muito bem recebido nas bilheteiras. O argumento do filme permite pensar numa sequela?
Possivelmente, mas nunca abordámos o filme pensando nisso. Se o fizessemos, seria o beijo da morte. Quando se cria um filme como a «Parte 1» de vários filmes, geralmente não funciona. Pensámos em «Mestres da Ilusão» como uma história única, que fará sentido para as pessoas ver como tal. Dito isto, claro que há uma possibilidade da coisa prosseguir. E eu adoraria, porque é ótimo ter muitas personagens mas temos apenas duas horas para contar a historia por isso não conseguimos passar muito tempo com cada uma delas. E eu adoraria passar mais tempo com estas personagens e criar mais interações entre elas, e principalmente passar mais tempo com estes atores. Parece que o digo isto para vender o filme mas acredite que é verdade: toda a gente se divertiu na rodagem, todos se deram bem e houve uma enorme entre-ajuda. Foi mesmo uma experiência muito especial.
Mas a sua história é verdadeiramente a do realizador europeu que foi para os EUA e conseguiu o sonho americano...
Sim, sem dúvida, todos os dias me belisco, mal posso acreditar. Isto é exatamente aquilo que eu sonhei. Eu cresci a ver filmes como o
«Salteadores da Arca Perdida» e
«O Império Contra-Ataca», em que havia um grande sentido da magia do cinema. E isso não existia em França ou na Europa em geral. Eventualmente em Inglaterra haveria alguma coisa, mas era em Hollywood que esses filmes espetaculares se faziam. Eram os filmes que eu queria fazer e agora estou a fazê-los. É inacreditável.
Tem algum plano de regressar ao Universo Marvel, que não pára de crescer?
Ainda não há nada decidido. Nós falamos muito e a verdade é que eu fui uma das primeiras duas pessoas a começar o atual Marvel Cinematic Universe, que culminou em
«Os Vingadores». No final de «O Incrível Hulk», quando surgiu o Tony Stark a falar da «Avengers Initiative», deu-se o primeiro cruzamento entre personagens. Já na altura, era muito claro na cabeça de toda a gente que aquilo era parte de um universo mais vasto. Claro que eu gostaria de regressar, mas com o filme certo, algo mesmo meu e que não fosse a sequela das aventuras de um herói começadas por outro autor. Mas estou feliz por ter sido um dos arquitetos originais da saga, para falta de termo melhor...
E calculo que um convite para realizar um dos próximo «Star Wars» seria irrecusável...
Isso seria espetacular. Eu tenho tanta sorte, estamos mesmo a falar do sonho americano. A equipa de som dos meus filmes trabalha no Skywalker Ranch, do George Lucas, e por isso eu passo lá muito tempo. E aquilo é muito inspirador, é excelente andar por ali, há lá outros realizadores com quem é possível falar, o George anda por lá, é espetacular, é o sonho cinematografico. Quanto ao «Star Wars», claro que se me telefonarem a convidar eu largo logo tudo e digo que sim.
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