O filme “As Minhas Sensações São Tudo O Que Tenho Para Oferecer”, sobre dinâmicas de casal e telepatia, que Isadora Neves Marques apresentou em Cannes, tem estreia nacional no festival Curtas Vila do Conde, na sexta-feira.

Depois da estreia mundial, em maio, na Semana da Crítica, paralela ao festival de cinema de Cannes, a 'curta' chega a Portugal para fazer parte da competição nacional do Curtas Vila do Conde.

Neste festival internacional, com sessão agendada para sexta-feira, a produção de Foi Bonita a Festa é apresentada pela primeira vez em território nacional, com Ágata de Pinho, Isadora Alves, Mário Afonso e Albano Jerónimo no elenco.

“Interessava-me, em simultâneo, a dinâmica de casal dentro de uma família, mas ao mesmo tempo o desejo de estar dentro de outra pessoa, sentir as sensações e sentimentos dessa outra pessoa. Principalmente dentro dessas dinâmicas íntimas, de casal, de família”, conta a realizadora, em entrevista à Lusa.

“As Minhas Sensações São Tudo O Que Tenho Para Oferecer” seguem “um contínuo” no seu percurso fílmico, até porque “muitas vezes os filmes surgem uns dos outros”, e mostram um jovem casal, Lourdes e Lana, que mantêm uma relação telepática.

Uma visita a casa dos pais de Lourdes, Vicente e Carl, expande a dinâmica ligada à ficção especulativa para um campo mais íntimo.

“Foi por aí que comecei a escrever o filme, e com o processo de escrita transformou-se, numa fase mais avançada, na telepatia. A telepatia foi algo que comecei a entender ser mais interessante, em termos formais, trabalhar em termos de cinema, com atores, texto, ‘voz off’, essas simultaneidades”, revela.

O corpo, marca temática habitual em trabalhos anteriores, “é uma coisa constante, e muito pessoal”, mas aqui acaba por dar lugar “ao interior da cabeça, dos pensamentos”.

“A meu ver, não é um filme tão físico como alguns outros trabalhos que já fiz. É um trabalho extremamente obsessivo, sobre estar dentro da cabeça de outra pessoa”, acrescenta.

O tipo de escrita que emprega “é um processo muito literário”, apostado em “criar pequenas janelas na vida destas personagens, aquilo que se chama um ‘slice of life’”, que em tradução livre seria “fatia de vida”, um género de cinema focado na exibição de pequenos momentos na vida de personagens.

“Espero que haja sempre essa sensação de que há um mundo que não vemos, mas ao vermos os filmes percebermos essa outra vida daquelas personagens. Construir um pequeno mundo em que vemos uma história, aquela janela, e que o espectador sinta que há algo lá fora, que a vida dos personagens continua quando o filme acaba”, esclarece.

A exibição desta última curta na Semana da Crítica “foi incrível”, e, tendo sido um objetivo assumido na produção, foi uma aposta ganha, dado que viu uma “ótima receção” à obra e deu um “impulso excelente” à distribuidora.

“Continuo em conversas com a Semana da Crítica sobre outros projetos que estou a desenvolver. Vila do Conde é sempre um festival que tem excelente programação, respeito imenso o festival e estive lá várias vezes. Também foi pensada essa estreia em Portugal”, conta.

Nascida em Lisboa, em 1984, a realizadora, artista e escritora tem apresentado filmes e outros trabalhos cinemáticos em festivais internacionais de cinema e galerias de arte, tendo sido responsável pelo projeto da representação portuguesa para a Bienal de Arte de Veneza de 2022.

Expôs no Museu Rainha Sofia, em Madrid, nas Galerias Serpentine, em Londres, no Palácio de Tokyo, em Paris, e nas bienais de Liverpool e Gwangju, entre outras, tendo fundado, com Catarina de Sousa, a produtora de cinema Foi Bonita a Festa, em 2021, sediada em São Pedro de Rates.

Tem publicado livros e, em 2020, fundou a editora de poesia Livros do Pântano, com Alice dos Reis. “Tornar-se um Homem na Idade Média” (2022), “A Mordida” (2019) e “Semente Exterminadora” (2017) são alguns dos filmes que realizou.