A curta-metragem, filmada numa aldeia em Tomar e lançada em 2022, relata a altura, em plena pandemia de COVID-19, quando os avós do realizador se separam após 60 anos de casamento, com a entrada da avó num lar devido ao agravamento da sua doença de Alzheimer e como o avô, de 90 anos, tenta recuperar a memória da mulher todos os dias.
“Eu comecei a filmar para mim, quando comecei a ver as imagens, quando vi a minha avó atrás do vidro, que é a cena de entrada do filme, quando vejo o olhar dela atrás do vidro, senti que havia qualquer coisa de muito mais universal do que a minha história, do que a história dos meus avós”, disse à Lusa Joel Cartaxo Anjos, que se mudou para Paris aos 19 anos para estudar Cinema, mas que continua a passar todos os verões em Portugal.
“Naquele ano, eu tive a sensação que, ou filmava ali ou não filmaria nunca”, afirmou o realizador, acrescentando que com este trabalho queria “contar como é que se vê a pessoa que se ama e com quem se partilhou a vida inteira a desaparecer e como é que se tenta resguardar o tempo”.
Para o cineasta português, esta é uma “história de partilha que é a história deles [dos seus avós], do amor deles", já que é difícil não ficar comovido ao ver o avô sozinho "à frente de toda aquela horta, como se tivesse à frente dele toda a história deles, que estava a desaparecer”.
“Eu cresci grande parte da minha infância com os meus avós numa aldeia perto de Tomar e são imagens que são muito marcantes da minha infância: o meu avô a trabalhar no campo, a minha avó a cortar couves para as galinhas, são imagens que são muito fortes para mim e eu queria filmar os meus avós porque queria ter uma imagem para poder guardar como forma de arquivo”, acrescentou.
Este “filme feito com nada”, apenas a câmara de Joel Cartaxo Anjos e a sua equipa, cujo projeto foi “um dos três premiados em França no concurso Le Grec, uma produtora que todos os anos seleciona três candidaturas entre 600 ou 700 para financiar e produzir”, foi este ano nomeado na categoria de curta-metragem documental dos Prémios Sophia da Academia Portuguesa de cinema.
“Os Prémios Sophia surpreenderam-me, fiquei muito feliz com a nomeação, sobretudo porque o filme não esteve em muitos festivais”, afirmou o realizador.
Em 2022, "As nossas primaveras passadas não voltam mais" esteve presente em festivais como Paris Côté court - Festival de curtas-metragens de Pantin em Paris e États généraux du film documentaire em Lussas, sendo posteriormente comprado pela France Television para ser transmitido na France 3, canal que “seleciona e compra à volta de 40 filmes por ano” nacionais e internacionais.
“É extraordinário, chegar a um público muito mais vasto do que aquele que podemos encontrar num festival de cinema, por exemplo, o programa de curtas-metragens no qual está integrada “As nossas primaveras passadas não voltam mais” é visto por cerca de 200 a 400 mil pessoas”, disse Joel Cartaxo Anjos, acrescentando que “chegar a este nível de audiência, é tentar chegar onde outros cineastas chegaram”.
Atualmente, Joel Cartaxo Anjos está a trabalhar num projeto com o fotógrafo esloveno cego Evgen Bavcar e continua a trabalhar com a Marina Gulbahari, atriz afegã refugiada em França após ter sido ameaçada de morte pelos talibãs no Afeganistão, com quem produziu em 2019 a curta-metragem "Tão longe de Cabul", também já divulgada pela France Television.
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