Após o prémio especial do júri da secção Un Certain Regard por "Elena" em 2011 e o de argumento por "Leviatã" três anos mais tarde, o cineasta russo Andrey Zvyagintsev regressou à Croisette com "Loveless" ("Nelyubov").
A sua quinta longa-metragem continua a aprofundar a situação no país, que descreve como estando a afundar-se no individualismo e na hipocrisia, sem valores ou sentimentos.
"Não posso imaginar-me a fazer algo que não me emocione. O que quero tratar são os problemas, que acredito serem importantes", declarou na conferência de imprensa coletiva, acrescentando ter-se inspirado numa história verídica para escrever o argumento.
Para capturar essa Rússia desumanizada, o cineasta optou por um retrato comovente de uma família despedaçada: Boris e Zhenya são um casal de classe média moscovita que, depois de anos de casamento, não se suporta mais e decide separar-se.
Cada um tem um novo projeto de vida, ele ao lado de uma jovem grávida e ela com um homem acomodado. Contudo, ainda vivem sob o mesmo teto e, mais importante, precisam decidir o que fazer com o seu filho Aliocha, de 12 anos, que é visto como um empecilho para os seus futuros.
Num ambiente de tensão, o jovem é testemunha de discussões e, finalmente, depois de um confronto violento, foge. Os pais são então confrontados com a sua busca. A polícia, sem meios suficientes, pouco pode fazer e é uma associação de voluntários dedicada a encontrar pessoas desaparecidas que assume o caso.
Inspirado por "Cenas da Vida Conjugal", de Ingmar Bergman (1973), Zvyagintsev filma sobriamente este casal, sempre ligado aos seus telemóveis.
Com imagens de grande beleza, Zvyagintsev mostra paisagens desoladoras, edifícios em ruínas, blocos de apartamentos, todos esses lugares inóspitos onde o jovem pode ter-se escondido, reflexo de um país insensível.
"A perda do filho pelos seus pais é para a Rússia uma metáfora da perda do relacionamento natural e normal com o nosso vizinho mais próximo, a Ucrânia", declarou o realizador russo, numa referência ao conflito no leste ucraniano.
A complexidade da infância
Outro filme a disputar a Palma de Ouro apresentado esta quinta-feira foi "Wonderstruck", do americano Todd Haynes.
Baseado no livro infantil homónimo de Brian Selznick, conta de forma intercalada a história de duas crianças surdas que partem sozinhas para Nova Iorque em busca dos pais, em dois momentos distintos, 1927 e 1977.
Haynes expõe a complexidade da infância, com toda a sua vulnerabilidade e força, num drama em tons de fábula que conta com Julianne Moore e Michelle Williams no elenco.
O cineasta americano assumiu uma série de desafios técnicos: trabalhar com crianças, filmar duas épocas - uma a preto e branco e outra a cores - e fazer um filme em parte mudo para refletir a surdez dos seus protagonistas.
"Nada foi fácil neste filme", admitiu Haynes, cujo filme anterior, "Carol", foi apresentado há dois anos no Festival de Cannes e recebeu seis nomeações para os Óscares
Além disso, o filme chileno "Los Perros" de Marcela Said, abriu a Semana da Crítica, uma mostra paralela independente dedicada a novos talentos.
Said, que já esteve na Quinzena dos Realizadores em 2013 com seu primeiro filme, "El Verano de los Peces Voladores", apresentou agora a história de uma mulher de meia idade burguesa que se sente atraída pelo seu professor de equitação, um ex-coronel que trabalhou na polícia secreta de Augusto Pinochet.
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