
James Bond nas mãos de uma empresa americana: choque e horror! E que é de um multimilionário, Jeff Bezos, que está a ser comparado ao vilão Ernst Blofeld.
A aquisição da icónica saga britânica pela Amazon preocupa os súbditos de Sua Majestade, com alguns a perguntar-se se 007 ainda tem futuro.
Após meses de disputas entre os produtores dos filmes e o estúdio Amazon MGM, amplamente noticiadas na imprensa britânica, o golpe final caiu na quinta-feira: o gigante americano presidirá agora ao destino do espião mais conhecido do mundo.
E pode fazer o que quiser: a família Broccoli, que até agora defendeu a saga que exportou o mito do glamour do MI6 para todo o mundo, cedeu o controlo criativo à Amazon.
Esta medida abalou a imprensa na terra natal do espião: no dia seguinte ao anúncio do acordo, o diário The Independent perguntou se, ao assumir o controlo da saga, a Amazon a tinha “enterrado”.
Enquanto isso, artigos nos jornais The Times e The Telegraph declaravam que James Bond “nunca” mais será o mesmo.
As intenções exatas da Amazon para a saga permanecem desconhecidas.
O que é certo, porém, é que “a Amazon quer um retorno do seu investimento”, disse à agência France-Presse (AFP) Chloe Preece, professora de marketing da ESCP Business School de Londres.
Para rentabilizar o acordo, a Amazon provavelmente criará “spin-offs” ou “prequelas”, bem como capitalizará o merchandising, disse.
O grupo de Jeff Bezos adquiriu o lendário estúdio MGM em 2022 por 8,45 mil milhões de dólares (o equivalente a 8,07 mil milhões de euros à cotação do dia), mas a família Broccoli manteve o controlo exclusivo da marca James Bond.
007 com um 'twist' Marvel
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De acordo com o The Times, a Amazon desembolsou mais mil milhões de dólares (960 milhões de euros) aos produtores Michael Wilson e Barbara Broccoli para reivindicar os direitos criativos.
Os termos financeiros do acordo não foram confirmados pela Amazon.
Bond vai tornar-se "mais corporativo. O volume (de filmes) vai mudar", estimou Tom Harrington, que trabalha na Enders Analysis, que fornece análises sobre a indústria do entretenimento.
Wilson e Broccoli, protegendo a personagem que moldou o cinema britânico desde a década de 1960, resistiram aos 'spin-offs' e ao licenciamento para fabrico de produtos que consideraram que manchariam a saga.
Barbara Broccoli trabalhou com quatro atores diferentes no papel de 007 - Roger Moore, Timothy Dalton, Pierce Brosnan e Daniel Craig - e descreveu o seu mandato como "dedicado a manter e desenvolver o extraordinário legado" herdado de Albert "Cubby" Broccoli, o seu pai.
“Sempre foi uma marca exclusiva, premium e antiquada”, disse o especialista em marketing Adrian Mediavilla, com um tempo médio de lançamento de filmes de “cerca de cinco anos”.
A Amazon, por outro lado, “quer construir um ecossistema, uma galáxia como a Marvel ou Super Mario”, segundo Mediavilla.
Para fazer isso, o estúdio poderá criar novas personagens e novas histórias.
“Há conteúdo suficiente”, disse Preece.
E também há fãs suficientes.
“Há um grande número de fãs”, disse Preece, acrescentando que os fãs estavam “desesperadamente” a esperar pelo próximo filme.
O último foi "007 - Sem Tempo Para Morrer" - o 25.º filme oficial e o canto do cisne de Craig, que arrecadou 775 milhões de dólares nas bilheteiras em 2021, rodado dois anos antes e adiado por causa da pandemia.
James Bond tornou-se 'woke'?
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Existe o risco de exploração excessiva e, por sua vez, de enfraquecimento da saga.
Será necessário “manter-se fiel à herança da marca” e à personagem criada há sete décadas pelo autor inglês Ian Fleming, sublinhou Mediavilla.
“Os Broccolis foram cuidadosos, com uma equipa unida de pessoas que conheciam a marca. Eles escolhiam o realizador, tomavam conta da saga”, disse Preece.
No entanto, a Amazon, assim como os seus concorrentes Netflix e Disney, trabalha com uma armada de argumentistas que inevitavelmente vão e vêm.
Para alguns, o perigo está noutra coisa. Os tablóides britânicos temem que James Bond se esteja a tornar "woke", a chamada ideologia que defende o fim das desigualdades raciais, do sexismo e da discriminação anti-LGTBQ+.
"Quando se olha para a evolução da marca, pode-se dizer que se tornou 'woke'", disse Preece, para quem a personagem Bond interpretada por Daniel Craig não tem quase nada em comum com a interpretada por Sean Connery ou Roger Moore.
“Eles evoluíram com o tempo”, acrescentou.
Os argumentistas atenuaram o lado mais rude de Bond e os ataques misóginos regulares às mulheres, e nos filmes mais recentes tentaram apresentar a imagem de um homem mais sensível.
Segundo Preece, a Amazon pode até explorar a criação de uma “série Bond girl”.
Mas os grandes perdedores poderão ser os cinemas. Todos os filmes da saga são grandes sucessos de bilheteira, mas a Amazon poderá agora dispensar o lançamento nas salas e oferecer o filme diretamente na sua plataforma de streaming Prime Video.
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