No acórdão datado de 25 de janeiro, cuja decisão foi inicialmente noticiada esta sexta-feira pelo jornal Público, o coletivo de juízes do STA decidiu “negar provimento ao recurso e, em consequência, manter o acórdão recorrido”, ou seja, negou dar razão aos seis bisnetos que contestam a vontade da maioria, favorável à trasladação dos restos mortais de Eça de Queiroz para o Panteão Nacional, uma homenagem ao escritor aprovada pela Assembleia da República.
No acórdão a que a Lusa teve acesso, o coletivo de conselheiros do STA contesta a argumentação dos autores do recurso, rejeitando, por exemplo, a alegação de que possa ser considerada uma presumível vontade anteriormente expressa pelos netos do escritor, em 1989, contrária à trasladação.
“(…) Tal direito, no caso dos herdeiros ou familiares, compete exclusivamente àqueles que se encontram vivos no momento em que se coloca (…) e o seu exercício traduz-se na manifestação de uma vontade atual, e não na ‘representação de uma vontade anteriormente expressa’”, lê-se no acórdão.
Para os conselheiros do STA, “sempre seria impensável que uma posição tomada, em determinado momento e num dado contexto, por parte dos conjunturais descendentes da altura, pudesse ter o efeito de comprometer, para todo o sempre, a possibilidade de futuras, e acaso distantes, iniciativas de homenagem”.
O coletivo de juízes contesta ainda a argumentação dos recorrentes de que a autorização da homenagem está dependente de uma vontade unânime e não apenas de uma maioria.
“Com efeito, exigir a unanimidade ou reconhecer um 'direito de veto' a um qualquer herdeiro ou familiar seria suscetível de colocar nas mãos desse familiar ou herdeiro o direito de defesa da memoria do falecido quanto ao destino por este intencionado relativamente aos seus restos mortais, potenciando conflitos com os demais familiares ou herdeiros legitimados e, sobretudo, pondo em causa o respeito pela memoria do falecido”, defendem os juízes.
Os juízes rejeitam ainda o argumento de que os restos mortais são “uma herança” do escritor, rejeitando a equiparação a bens patrimoniais, por exemplo.
O coletivo do STA defende, por isso, que se verifica “a existência de uma maioria de pessoas legitimadas” para tomar a decisão relativa à trasladação dos restos mortais de Eça de Queiroz.
Os seis bisnetos de Eça de Queiroz que tinham avançado com uma providência cautelar para impedir a trasladação dos restos mortais do escritor para o Panteão Nacional anunciaram ainda em outubro recurso da decisão, depois de conhecida a primeira decisão do tribunal.
Dos 22 bisnetos do escritor, 13 concordaram com a trasladação para o Panteão Nacional, havendo ainda três abstenções.
Também a Fundação Eça de Queiroz, presidida pelo escritor Afonso Reis Cabral, é favorável à trasladação, tendo sido a primeira a avançar para este processo.
A resolução da Assembleia da República que concede honras de Panteão Nacional a Eça de Queiroz (Resolução 55/2021), impulsionada pelo grupo parlamentar do PS, foi aprovada por unanimidade, em plenário, no dia 15 de janeiro de 2021.
Para o efeito foi constituído um grupo de trabalho que desenvolveu uma série de diligências, tendo a trasladação sido marcada para o passado dia 27 de setembro.
A cerca de uma semana desta data, o grupo de seis bisnetos fez um pedido de providência cautelar para a suspensão da resolução parlamentar, depois de já se ter dirigido ao presidente da Assembleia da República, mais de dois anos passados sobre a decisão, para propor que as honras fossem concedidas através da aposição de uma lápide evocativa no Panteão, sem a trasladação dos restos mortais, que se encontram em Tormes, no concelho de Baião.
Eça de Queiroz morreu a 16 de agosto de 1900 e foi sepultado em Lisboa. Em setembro de 1989, os seus restos mortais foram transportados do Cemitério do Alto de São João, na capital, para um jazigo de família, no cemitério de Santa Cruz do Douro, em Baião, distrito do Porto.
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