“Não me parece que Tom seja um assassino nato”, afirmou o ator, numa conferência de lançamento da série em que a Lusa participou. “Não vejo o Tom como um vilão”, frisou. “Ele é tão complexo e é demasiado simplista chamar-lhe vilão. Certamente é um antiherói”.
Scott, que em 2023 foi aclamado pela crítica pelo papel no filme “All of Us Strangers”, considerou que o grande sucesso da história e deste argumento é levar a audiência a torcer por alguém que não deveria apoiar. “Queremos basicamente que ele se safe”, afirmou.
O ator recusou-se a fazer diagnósticos sobre a personalidade de Ripley e porque faz o que faz. “A razão pela qual este personagem é tão duradouro e icónico é que temos tantas perguntas sobre ele”, salientou, referindo que responder de forma demasiado específica é redutor.
“Consideramo-lo fascinante, assustador, aterrorizador ou desconfortável porque não temos muita informação sobre ele”, continuou. “É como segurar em água, temos de ter uma noção sem diagnosticar a sua nacionalidade, idade ou sexualidade, é algo que não conseguimos bem apanhar”.
O ator descreveu um vigarista que é ignorado pela sociedade sendo incrivelmente dotado. “É um artista que tem de sobreviver de forma fraudulenta e não tem acesso a nenhuma das coisas bonitas que outros personagens na história têm, como música e beleza”, opinou. “Há uma mensagem dentro da história de que toda a gente merece beleza e arte. Não é só para uma certa secção da comunidade”.
Scott interpreta um personagem que foi incarnado na Sétima Arte por Matt Damon, no filme de 1999 “O Talentoso Sr. Ripley”, de Anthony Minghella, que viria a receber cinco nomeações para os Óscares. Antes tinha já sido abordado por atores como Alain Delon ("À luz do sol", René Clement), que o estreou no cinema, Dennis Hooper ("O amigo americano", Wim Wenders) ou John Malkovich ("O jogo de Mr. Ripley, Liliana Cavani).
Andrew Scott, que protagoniza a série ao lado de Dakota Fanning, Maurizio Lombardi e Johnny Flynn, reconheceu o peso desse legado, tendo sobretudo em conta o filme Minghella e as nomeações da Academia de Hollywood.
“É um filme que as pessoas adoram e era uma preocupação, será que vai ser um ‘remake’?”, apontou Scott. “Desde o início percebi que a intenção de Steven Zaillian, o nosso argumentista e realizador, era a oposta”.
O criador da série, que participou noutra conferência de imprensa, confirmou essa ideia ao explicar que era fã do livro e achava que a história precisava de mais tempo para ser contada – daí o formato de oito episódios.
“Permitiu-me mergulhar nos detalhes da história e do personagem e as relações mutáveis entre os personagens de uma forma que não se consegue em duas horas”, salientou Zaillian.
Para Dakota Fanning, que dá vida a Marge Sherwood, o formato prolongado permitiu “ir mais fundo” numa personagem que enfrenta Tom Ripley numa série contada da perspetiva dele, não da dela.
“Permitiu-me criar a perspetiva da Marge e a sua realidade, e ver onde intersetaram e onde divergiram”, afirmou a atriz na conferência. “Permitiu explorar o que está escondido e o que não é dito tanto quanto o que é dito”, considerou, caracterizando como “emocionante” ter feito parte desta série.
A ausência de cor deveu-se à intenção de fazer mergulhar a audiência numa outra era e dar à série, filmada em Itália no inverno, o tom sombrio e agourento da obra.
“O livro foi escrito em 1955. É a versão narrativa de um filme ‘noir’, e isso justificava filmar em preto e branco”, considerou Zaillian.
O realizador, tal como Scott, nunca pensou em Ripley como um psicopata e disse que não costuma procurar que os seus personagens criem empatia na audiência: escreve-os como são.
“Certamente não é um assassino profissional, não é bom nisso, fá-lo da mesma forma atrapalhada que nós faríamos”, afirmou. “É também por isso que nos identificamos com ele. Não é melhor nisto que nós seríamos”.
“Ripley” estreia-se na quinta-feira, 4 de abril, no Netflix, e tem oito episódios.
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